MARIA DE NAZARÉ
Frederico Guilherme
Kremer
O século XX foi anunciado com os pensamentos pessimistas dos filósofos
da “morte de Deus”, como Nietzsche (1844-1900) e Feuerbach (1804-1872), que
perduraram até o início da Segunda Guerra Mundial e se materializaram em
índices jamais vivenciados de dor e desespero. Entretanto, encerrou-se, surpreendentemente,
com Deus vivo em todos os censos populacionais realizados no mundo e com um
fenômeno registrado por revistas internacionais (“Time” e “Newsweek”) e
nacionais, denominado como a Era de Maria.
O indicador mais expressivo foi o aumento significativo dos peregrinos visitando
os santuários marianos espalhados pelo mundo. Outros dois fatos relevantes são
o número acentuado das denominações regionais de Maria, que pode chegar a dois
mil mundialmente, chegando a 300 apenas no Brasil, e a ponte que a figura de
Maria está estabelecendo entre as escolas cristãs católicas e protestantes e
até com os islâmicos, que também veneram Maria.
Das análises elaboradas para explicar o fenômeno, destacamos a que
propõe como causa o desconhecimento da sua vida, propiciando que as gerações
possam estabelecer uma visão própria e, principalmente, que reflita os anseios
de espiritualidade, em especial ao final do século XX, após tantos sofrimentos.
Por Jesus ter antecipado o seu ministério público nas bodas de Caná a seu
pedido, Maria é considerada a grande intercessora da humanidade junto a Jesus.
Se o Mestre é o sol nas nossas almas, Maria é a lua que reflete Sua luz, na
noite dos sofrimentos humanos.
Realmente de Maria pouco sabemos, porque os Evangelhos não são uma biografia
de Jesus e, por isso, a parte inicial referente ao Seu nascimento, infância e
juventude tem muitas lacunas, deixando espaços vazios que foram preenchidos pelos
evangelhos apócrifos (isto é, aqueles sobre cuja autenticidade se têm dúvidas)
e, para os espíritas, pelas informações espirituais trazidas através da
mediunidade, que igualmente merecem análise visto que também podem não ser
verdadeiras, pois dependem das qualidades do médium e do Espírito comunicante.
O interesse por Maria é antigo e vem da igreja primitiva. Após as
grandes discussões sobre a natureza divina do Cristo, principalmente na igreja
do oriente, onde se falava o grego, uma língua propícia às discussões, pois as
palavras podem ter vários sentidos, as atenções voltaram-se para Maria. Como
ficaria a mãe de Jesus, considerado Deus, segundo o credo de Niceia? Surgiram,
então, os quatro dogmas marianos.
Em junho de 431, num concílio na cidade de Éfeso, foi definido o
primeiro dogma, que é a maternidade divina. Em 641, na catedral de Latrão, em
Roma, a virgindade perpétua. Em 1854, a imaculada conceição, isto é, Maria não
teria o pecado original, e, mais recentemente, em 1950, a sua assunção, ou
seja, a ressurreição no corpo, a exemplo de Jesus. Muitos estudiosos consideram
que em Maria foram projetadas as devoções pagãs da grande deusa-mãe. Lembramos
que, em 410, os bárbaros de Alarico saquearam Roma, criando uma grande
fragilidade na comunidade cristã e um aumento das críticas do paganismo aristocrático
que ainda tinha muitos adeptos, embora na época o Cristianismo já fosse
religião oficial do Império Romano.
Dogmas à parte, visto não pertencerem ao arcabouço dos pensamentos espíritas,
embora respeitáveis simbolicamente, a Maria que os Evangelhos nos apresentam
tem uma virtude peregrina que é a humildade, em sintonia com os acontecimentos
que envolveram o nascimento do Salvador. Humildade no sentido de saber, embora
muito jovem, quem ela é e a sua missão na Terra, expressa na grande afirmação
ao anjo Gabriel: “Eis aqui a escrava do Senhor, cumpra-se em mim segundo a Sua
vontade.” Como consequência, sentimos uma resignação e devoção a Deus,
emoldurando um coração terno de mãe.
Como costume na família judaica da época, Maria foi responsável pela educação
de Jesus até por volta dos seus 8 anos, quando então José assumiu este papel. Maria
soube educar Jesus para Sua missão, deixando-O livre dos seus projetos e idealizações,
muito comum aos pais. Entretanto, gostaríamos de mencionar uma referência do
Espírito Humberto de Campos no magnífico livro “Boa Nova” (capítulo 30), da
lavra mediúnica de Francisco Cândido Xavier. Conta o autor um complemento do
único fato mencionado nos Evangelhos sobre a adolescência de Jesus, quando aos
12 anos perdeu-se dos pais em Jerusalém (Lucas, 2:41-52). Maria, aflita,
encontrou-O conversando com os sacerdotes do Templo. Na ocasião, impressionados
com a sabedoria do menino, ofereceram a Maria uma grande oportunidade para uma
família pobre: a educação de Jesus no Templo. Entusiasmada com a proposta,
comunicou-a ao filho, que, após pensar, respondeu, com sabedoria, que iria
permanecer com o pai ajudando-o no trabalho.
Humberto de Campos também esclareceu que Maria morou em Éfeso com o
evangelista João, confirmando as visões de uma freira agostiniana chamada Ana
Emerik no início do século XIX. Ana adoeceu gravemente e começou a ter visões.
Numa delas descreveu a casa de Maria, que ficaria distante três horas de Éfeso,
numa colina. As visões despertaram o interesse do escritor Clemens Brentano,
que publicou um livro sobre elas em 1852. Em 1881, um padre francês foi para a
Turquia descobrir a casa de Nossa Senhora. Atualmente, é um santuário muito
visitado.
Encerramos lembrando as últimas palavras de Maria nos Evangelhos, que
soam como uma recomendação fundamental para a humanidade. Nas bodas de Caná
exortou os servos a atenderem as orientações de Jesus, exclamando: “Façam tudo
aquilo que Ele vos disser.”
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Setembro
2013 – no 2228
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