Quando pensei que já íamos embora, Enrico levou-me a outra capela.
Sollano desencarnara e seus dois filhos oravam em silêncio junto ao seu corpo.
Em um aparelho de som, as músicas clássicas eram um convite à meditação e
quando alguém conversava dentro da capela, um dos filhos pedia silêncio. Era a
hora da despedida. Muitos choraram baixinho quando a valsa do adeus foi tocada.
Não ouvimos comentários sobre a forma do desencarne de Sollano, como também nada
ouvimos sobre ele. Já estávamos curiosos. Oramos junto àquela família. O
Evangelho Segundo o Espiritismo era lido desde o primeiro capítulo e
comentado pelos espíritas presentes. Quando paravam, o volume da música era aumentado
para conter o possível bate-papo. Depois, cada pessoa fazia prece de acordo com
seu sentimento. Busquei Sollano e fiquei contente. Já desprendido do corpo
físico, ele palestrava junto a outros espíritos. Não podia estar melhor.
— Como pode isso acontecer? perguntei a Enrico.
— Meu filho, Sollano sempre foi um tarefeiro de Jesus. Na Casa
Espírita que ele fundou, o alicerce foi colocado com o cimento da renúncia e as
paredes, com o suor de cada fundador da Casa.
Ele, Luiz Sérgio, fez do seu lar uma oficina de Jesus. Sempre cuidou
da terra que lhe fora ofertada para arar. Jamais se "aposentou", ao
contrário, cada vez mais o trabalho lhe roubava as horas de lazer. Fez da
Doutrina Espírita o seu ideal de vida. Todos os familiares tornaram-se
espíritas através dos seus exemplos. Era digno, jamais se julgou dono da
verdade ou condenou alguém por não agir como ele. O dinheiro, às vezes pouco,
multiplicava-se em prol dos pobres e da Casa Espírita. Repare nos espíritos que
vieram recebê-lo!
Inebriado, vi como o espírito de Sollano brilhava; os seus centros
de força possuíam luminosidade radiante. Presenciei em seu corpo de carne uma
luz e, intrigado, perguntei a Enrico por que o corpo físico de Sollano também
brilhava.
— Foi um convívio respeitoso entre corpo e espírito durante muitos
anos e Sollano limpou tanto a sua casa física, que ela se tomou uma casa
iluminada. Ele jamais descuidou de sua alma e de seu corpo. Quando os homens se
conscientizarem de que o corpo físico é uma casa que também precisa de cuidados,
não colocarão excessos nele.
A casa-corpo, que por alguns anos abrigou Sollano, não era hoje
uma casa corroída e maltratada, não; era uma casa que agora estava vazia, mas
que o seu dono soube perfumar com o amor e o trabalho. O corpo jazia frio e
inerte. Os filhos e amigos o velavam, mas o espírito, junto aos outros amigos espirituais,
esperava a hora do sepultamento, para depois buscar no plano mais alto um lugar
para iniciar novos trabalhos, porque um espírito com Jesus é o amor em ação.
— Posso me aproximar dele?
— Pode Luiz. Cheguei perto.
— Sollano, seja bem-vindo.
— Luiz Sérgio, irmão, que Deus o ilumine pelo consolo a tantas
almas que o procuram. Fico feliz em abraçá-lo, esperando que cada vez mais o
irmão busque em todos os lugares aqueles que precisam. Um dia li um dos seus
livros e chorei de alegria, porque foi bom saber que a Espiritualidade Maior
está sempre junto à sociedade atual, tão carente de elucidações.
Abraçou-me forte. Enrico também aproximou-se para lhe dar as
boas-vindas.
Era a recepção a alguém que soube viver com dignidade.
Luiz Sérgio
NA HORA DO ADEUS
Psicografía: Irene Pacheco Machado
2a Edição • 1997
Nenhum comentário:
Postar um comentário