CAPÍTULO VIII: BEM-AVENTURADOS OS PUROS DE CORAÇÃO
ITENS 11 A 17: ESCÂNDALOS: CORTAR A MÃO
“O que escandalizar porém, a um destes pequeninos que crêem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma mó de atafona (*), e o lançasse no fundo do mar. Ai do mundo por causa dos escândalos. Porque é necessário que sucedam escândalos, mas ai daquele homem por quem vem o escândalo. Ora, se a tua mão, ou o teu pé, te escandaliza, corta-o e lança fora de ti. Melhor te é entrar na vida manco ou aleijado, do que, tendo duas mãos ou dois pés, ser lançado no fogo eterno. E se o teu olho te escandaliza, tira-o, e lança-o fora de ti. Melhor te é entrar na vida com um só olho, do que, tendo dois, ser lançado no fogo do inferno. Vê, não desprezes algum destes pequeninos, porque eu te declaro que os seus anjos no céu, incessantemente, estão vendo a face de meu Pai, que está nos céus. Porque o Filho do Homem veio a salvar o que havia perecido. (Mateus XVIII:6-11)
“E se teu olho direito te serve de escândalo, arranca-o e lança-o fora de ti, porque melhor te é que se perca um de teus membros, do que todo o teu corpo ser lançado no inferno. E se a tua mão direita te serve de escândalo, corta-a e lança-a fora de ti; porque melhor te é que se perca um dos teus membros, do que todo o teu corpo ir para o inferno. (Mateus V:29 e 30)
Muitas e muitas vezes, Jesus usou de expressões fortes e rigorosas nos seus ensinos. Lembremo-nos sempre de que ele nada escreveu, sua intenção era deixar na mente dos que o ouviam, suas lições, mesmo se não os compreendessem bem, naquele momento.
Confiou nos seus discípulos, não só nos que o acompanharam, mas nos que o ouviam e aceitavam, para a divulgação do aprendido.
Usava, pois, de expressões usuais, para que fixassem o que ouviam, tais como pendurar a mó no pescoço e ser lançado ao mar, fogo eterno, fogo do inferno, apenas para que suas metáforas ajudassem na fixação das lições que, pretendia ele, fossem divulgadas por toda a humanidade.
O espiritismo explica que punição eterna contraria o amor e a justiça de Deus. Entende-se inferno, fogo do inferno, como sendo o sofrimento causado pelas infringências às leis divinas, pelo remorso dos erros cometidos, que pode ser extremamente doloroso, conforme os requintes de maldade com que essas faltas foram perpetradas, mas, sempre sofrimento provisório, levando o Espírito a querer libertar-se, passando a querer redimir-se, seja a que preço for.
Kardec explica nesse texto que, no sentido evangélico, a palavra escândalo tem um sentido mais amplo, não sendo apenas “o que choca a consciência alheia, mas tudo o que resulta dos vícios e das imperfeições humanas, todas as más ações de indivíduo para indivíduo, com ou sem repercussões. O escândalo, nesse caso, é o resultado efetivo do mal moral.”
Natural que, na Terra, morada de espíritos rebeldes, difíceis de entenderem o verbo amar, haja os erros, as maldades, os equívocos, as omissões, frutos dos vícios e da imperfeição dos seus habitantes.
Necessário, pois, que essas infringências da Lei Divina se mostrem, se evidenciem, para que possam ser conhecidos também nos seus efeitos, a fim de serem combatidas.
O homem não tem necessidade de praticar o mal, ninguém nasce destinado a fazer o mal; todos nascem para melhorar-se, para reformar-se.
Todavia, dada a imperfeição moral humana, essa evolução se faz com lentidão, visto ser ela realizada, primeiro, internamente, pela vontade do ser. Ninguém é violentado no seu querer, para corrigir-se.
As leis naturais morais, que regem o comportamento do homem em relação a si mesmo, ao próximo e a Deus, são acionadas, constantemente, devolvendo as conseqüências dos sentimentos, pensamentos e atos de cada um, para que, nesses resultados, bons ou ruins, saiba o homem se está certo ou não, aprendendo, então a usar seu livre-arbítrio, sem prejudicar ninguém, nem a si próprio.
Assim do próprio mal, sai o bem.
Para todos, surge o momento, em que, cansado de sofrer as conseqüências dos seus atos negativos, aqui ou no plano espiritual, o Espírito, pensa que deve existir um Ser Superior que o ama, abdica do seu orgulho, suplica-Lhe ajuda, considerando-se vencido.
Busca ajuda, encontra amigos, raciocina, analisa, reinicia uma nova jornada de lutas contra suas más inclinações, mas , se perseverar, porque muito sofreu, não mais querendo o retorno aos valores ilusórios, progredirá, amparado por amigos encarnados e desencarnados, começando a perceber, dentro de si, diferentes prazeres, que o estimulam a continuar o desenvolvimento dos valores espirituais, que fazem parte de sua essência.
Passa, então a considerar-se, não um vencido, mas alguém que se posicionou na estrada da evolução moral, desenvolvendo seu potencial divino, caminhando com confiança em Deus, no próximo e em si.
É assim que o mal desaparecerá um dia da Terra, e sua humanidade trabalhará no bem, pelo bem e para o bem.
Todavia, “ai daquele por quem vem o escândalo”, porque estando sob a lei de causa e efeito, receberá, mais cedo ou mais tarde, as conseqüências do ato praticado, e não se libertará enquanto no quitar essa dívida, pela dor ou pelo amor.
Serviu, pelo seus maus instintos, sem o saber, de instrumento para a justiça divina, mas, cometeu uma infração à lei do Bem, ficando, pois, sujeito às suas conseqüências. Pode redimir-se, pelo arrependimento, que o colocará nas mesma situação de antes, não, necessariamente, com as mesmas pessoas, dando-lhe a chance de fazer, exatamente, o contrário do que fez, auxiliando, perdoando, cumprindo com satisfação, talvez, um difícil dever, amando e servindo.
É assim que o mal vai desaparecendo dos corações humanos.
Nas frases em que Jesus diz ser preferível cortar ou arrancar o membro causador do escândalo, Kardec afirma que elas significam a necessidade de arrancarmos, de dentro de nós mesmos, as plantas que o Senhor não plantou, frutos do nosso orgulho e egoísmo, que nos levam a querer tudo para nós, seja por quais meios, seja por quais lesões provoquemos no outro.
“É necessário arrancar do coração todo sentimento impuro e toda tendência viciosa.”
Diz também que sem a chave oferecida pelo espiritismo, muitas coisas não podem ser compreendidas.
Assim, podemos também, interpretar essas expressões, como sendo o que ocorre nas reencarnações, em que o homem sofre deficiências físicas ou mentais, para sentir o que fez aos outros, aprender os efeitos do mal, mas também como uma oportunidade de não reincidir nas mesmas faltas de outrora.
A lei das vidas sucessivas está bem clara , nessas expressões de Jesus, como: “Melhor te é entrar na vida com um só olho, do que, tendo dois, ser lançado no fogo do inferno” ou seja, melhor reencarnar com deficiências físicas ou mentais, sem as facilidades tidas antes, para, mais facilmente, nas novas experiências, semelhantes ou diferentes das anteriores, que o levaram ao mal, adquirir novos hábitos saudáveis, reiniciando uma nova fase de sua vida eterna.
Por muito termos causado sofrimentos a outros, estamos, apesar do nosso desenvolvimento intelectual, presos ao nosso passado, que vive em nosso subconsciente, esperando nossa redenção, através do cumprimento do dever, nas agradáveis ou desagradáveis situações, em benefício de nós próprios ou de outrem.
* - mó é a pedra com que se trituram os grãos no moinho.
- atafona é o engenho de moer grãos, manual ou movido por animais; moinho.
Bibliografia:
KARDEC, Allan - “O Evangelho Segundo o Espiritismo”
Leda de Almeida Rezende Ebner
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