EM TORNO DA FÉ
Dizia a professora de História - já lá
vão uns anitos -, referindo-se sob certo aspecto à transição da época medieval
para a Idade Moderna, que, em tempos idos, quando dois fulanos ilustrados se
encontravam, por hipótese, a meio caminho entre povoações, lembrando-se de
discutir algum assunto da ciência oficial da época, mediante qualquer
antagonismo de argumentação, recorriam a uma consensual solução: os tira-teimas
eram os textos clássicos e os de ordem religiosa. Ou seja, estava escrito, era
como era!
Hoje
ainda encontramos no movimento espírita, e fora dele, muita gente a pensar
assim. Será natural... mas indesejável.
É
que as coisas não valem tanto como isso porque estão escritas, mas sim por
serem passíveis de se compatibilizar com a realidade objectiva - o mais
possível, pelo menos! Porque são racionais, porque têm fundamento, pois a
experiência as suporta.
Tratar-se-á
da dicotomia entre dogma e ciência.
Isto
vem a propósito da distinção entre as chamadas fé divina e fé humana. Vem na
seqüência do tipo de estrutura prática da fé dos espíritas (desejar-se-ia que
fosse mais a inspirada pelo espiritismo ou doutrina espírita).
O que é isso?
Normalmente,
esta palavra de duas letras - fé - apenas contém subjectivamente uma grande
carga emotiva, no sentido de o homem comum lhe atribuir um sentido meramente
religioso. Contudo, fé é muito mais do que isso!
É
certamente uma convicção, mais ou menos fundamentada. E... em quê? Sim: em quê?
Naturalmente,
ora se fundamentará numa crença cega (aquela do é porque é) ora, de outro modo,
numa crença baseada em factos. Será a dita fé cega (base do fanatismo, tocando
a criminalidade, às vezes) e, alternativamente, a chamada fé raciocinada (a que
é capaz de «enfrentar a razão face a face em todas as épocas da Humanidade»,
segundo a cardequeana). Espíritas que existam (um contra-senso empírico) que
não estudem, estão bem no meio, com perspectivas relativas de melhoria...
Outros
há, até profissionais espiritualistas (sacerdotes), que afirmam que fé e razão
não se tocam - e que outra coisa seria de esperar! Não conhecem o espiritismo a
não ser pelo rótulo. (Disseram-lhes que o conteúdo era proibido...).
Nada
há na natureza que não possa ser pesquisado, caminhando-se para uma tomada de
conhecimento gradual e crescente. É o sentido histórico da Humanidade, uma
derrogação evidente do pretexto do sobrenatural (que nunca existiu).
Mas
a fé é um exercício no dia-a-dia. Só que quase nem nos apercebemos disso.
A humana
Está
tão entranhada no quotidiano que nem notamos: é o comportamento perante o
semáforo no trânsito citadino (o vermelho que nos inibe o movimento e o verde
que nos induz a avançar, a partir do momento em que assimilamos o mecanismo de
causa e efeito relativo); ou na própria ingestão de alimentos, às refeições
(confiamos nas capacidades digestivas do organismo, pois o seu mecanismo,
inconsciente embora, funciona - e nós estamos «carecas» de saber isso).
No
fundo e na superfície é a crença do cientista que repete experiências,
elaborando numerosas hipóteses explicativas, testando-as em laboratório,
chegando a conclusões, certo de que chegará à meta do conhecimento e domínio de
certa lei. É o fundamento do trabalho do engenheiro que esboça projectos de
máquinas para atingir maior rendimento numa certa actividade industrial. E por
aí fora...
Da
fé humana, que resulta da repetição de vivências que permitem prever que um
determinado agora provoca um específico depois, caminhamos para a fé divina.
A divina
O
seu mecanismo é idêntico. A partir do momento em que percebemos que vivemos
segundo a lei (que não nos pede opinião para agir) das vidas sucessivas,
colhendo aulas, repetidas e renovadas, em cada uma delas torna-se fácil
compreender que um religioso diga que a fé não se liga com o raciocínio (dado que
ele se atém aos dogmas hierárquica e tradicionalmente estabelecidos - aí há que
obedecer, ainda que...). Mesmo assim, por outro lado, evidencia-se a capacidade
diferente, em cada qual, de perceber, de «apanhar o ângulo», de molde a ser uma
criatura habilitada a manipular quotidianamente o seu «grão de mostarda» de fé.
Contudo,
a fé, para quem diz não a ter, ainda que mais pequenita do que o grão referido,
se parece não estar lá, intimamente, ganha-se, melhor, conquista-se. Como?
Estudando, observando, aprendendo. Aqui temos que notar: não há pior aluno do
que o que não se deixa motivar para apreender; e quem procura acha.
O leme
O
assunto não é simples, mas também não é totalmente complexo. Estar na vida, já
estamos. Tudo indica que a morte seja uma quimera e o suicídio a pior porta que
podemos abrir (mais valeria ficar parado!). Por isso, no nosso próprio
interesse, torna-se indispensável ver por onde estamos a conduzir a barca desta
vida - somos nós mesmos quem está ao leme. O marinheiro competente tem fé na
bússola. Nós temos cuidado de atender a essa orientação? O rumo é duvidoso se
não nos inspiramos numa fé consciente, tendo mão no leme.
E o
que é essa fé tão vantajosa? É a fé raciocinada, a que assenta em factos, dando
uma opinião lúcida, uma crença fundamentada na realidade objectiva, embora
tendo a sua vertente subjectiva, traçando as realizações, de quaisquer
tamanhos, do amor e da sabedoria, os tesouros que Deus - essa causa primeira e
inteligentíssima - nos chama a partilhar, pouco a pouco, no desfiar dos
séculos. Mas desde já.
Condições para a cura - a importância da fé
A
recepção e assimilação dos fluidos dependerá das condições no paciente e no
ambiente (problemas cármicos e outras circunstâncias) que favoreçam ou não a
permuta e assimilação fluídica.
"Com
relação à corrente fluídica" o curador age como uma bomba calcante e o
enfermo "como uma' bomba aspirante", esclarece Kardec ("A
Gênese", XV, item li), acrescentando:
"Algumas
vezes, é necessária a simultaneidade das ações; doutras, basta uma só".
A
fé, portanto, não é uma virtude mística mas uma força atrativa.
Quando
o enfermo não tem essa fé, "opõe à corrente fluídica uma força repulsiva,
ou pelo menos uma força de inércia, que paralisa a ação".
Podemos
entender, agora, porque Jesus, ao curar alguém, dizia: "Se tiveres
fé" ou "A tua fé te salvou".
PODER
DA FÉ
1. Quando ele veio ao encontro do povo, um
homem se lhe aproximou e, lançando-se de joelhos a seus pés, disse: Senhor, tem
piedade do meu filho, que é lunático e sofre muito, pois cai muitas vezes no
fogo e muitas vezes na água. Apresentei-o aos teus discípulos, mas eles não o
puderam curar. Jesus respondeu. dizendo: Ó raça incrédula e depravada, até
quando estarei convosco? Até quando vos sofrerei? Trazei-me aqui esse menino. -
E tendo Jesus ameaçado o demônio, este saiu do menino, que no mesmo instante
ficou são. Os discípulos vieram então ter com Jesus em particular e lhe
perguntaram: Por que não pudemos nós outros expulsar esse demônio? -
Respondeu-lhes Jesus: Por causa da vossa incredulidade. Pois em verdade vos
digo, se tivésseis a fé do tamanho de um
grão de mostarda, diríeis a esta montanha: Transporta-te daí para ali e ela se
transportaria, e nada vos seria impossível. (S. MATEUS, cap. XVII, vv. 14 a
20.)
2.
No sentido próprio, é certo que a confiança nas suas próprias forças toma o
homem capaz de executar coisas materiais, que não consegue fazer quem duvida de
si. Aqui porém unicamente no sentido moral se devem entender essas palavras. As
montanhas que a fé desloca são as dificuldades, as resistências, a má-vontade,
em suma, com que se depara da parte dos homens, ainda quando se trate das
melhores coisas. Os preconceitos da rotina, o interesse material, o egoísmo, a
cegueira do fanatismo e as paixões orgulhosas são outras tantas montanhas que
barram o caminho a quem trabalha pelo progresso da Humanidade. A fé robusta dá
a perseverança, a energia e os recursos que fazem se vençam os obstáculos,
assim nas pequenas coisas, que nas grandes. Da fé vacilante resultam a
incerteza e a hesitação de que se aproveitam os adversários que se têm de
combater; essa fé não procura os meios de vencer, porque não acredita que possa
vencer.
3.
Noutra acepção, entende-se como fé a confiança que se tem na realização de uma
coisa, a certeza de atingir determinado fim. Ela dá uma espécie de lucidez que
permite se veja, em pensamento, a meta que se quer alcançar e os meios de
chegar lá, de sorte que aquele que a possui caminha, por assim dizer, com
absoluta segurança. Num como noutro caso, pode ela dar lugar a que se executem
grandes coisas.
A fé
sincera e verdadeira é sempre calma; faculta a paciência que sabe esperar,
porque, tendo seu ponto de apoio na inteligência e na compreensão das coisas,
tem a certeza de chegar ao objetivo visado. A fé vacilante sente a sua própria
fraqueza; quando a estimula o interesse, toma-se furibunda e julga suprir, com
a violência, a força que lhe falece. A calma na luta é sempre um sinal de força
e de confiança; a violência, ao contrário, denota fraqueza e dúvida de si
mesmo.
4.
Cumpre não confundir a fé com a presunção. A verdadeira fé se conjuga à
humildade; aquele que a possui deposita mais confiança em Deus do que em si
próprio, por saber que, simples instrumento da vontade divina, nada pode sem
Deus. Por essa razão é que os bons Espíritos lhe vêm em auxílio. A presunção é
menos fé do que orgulho, e o orgulho é sempre castigado, cedo ou tarde, pela
decepção e pelos malogros que lhe são infligidos.
5. O
poder da fé se demonstra, de modo direto e especial, na ação magnética; por seu
intermédio, o homem atua sobre o fluido, agente universal, modifica-lhe as
qualidades e lhe dá uma impulsão por assim dizer irresistível. Daí decorre que
aquele que a um grande poder fluídico normal junta ardente fé, pode, só pela
força da sua vontade dirigida para o bem, operar esses singulares fenômenos de
cura e outros, tidos antigamente por prodígios, mas que não passam de efeito de
uma lei natural. Tal o motivo por que Jesus disse a seus apóstolos: se não o
curastes, foi porque não tínheis fé.
A fé religiosa. Condição da fé inabalável
6.
Do ponto de vista religioso, a fé consiste na crença em dogmas especiais, que
constituem as diferentes religiões. Todas elas têm seus artigos de fé. Sob esse
aspecto, pode a fé ser raciocinada ou
cega. Nada examinando, a fé cega
aceita, sem verificação, assim o verdadeiro como o falso, e a cada passo se
choca com a evidência e a razão. Levada ao excesso, produz o fanatismo. Em assentando no erro, cedo
ou tarde desmorona; somente a fé que se baseia na verdade garante o futuro,
porque nada tem a temer do progresso das luzes, dado que o que é verdadeiro na
obscuridade, também o é à luz
meridiana. Cada religião pretende ter a posse exclusiva da verdade; preconizar alguém a fé cega sobre um ponto
de crença é confessar-se impotente para demonstrar que está com a razão.
7.
Diz-se vulgarmente que a fé não se
prescreve, donde resulta alegar muita gente que não lhe cabe a culpa de não
ter fé. Sem dúvida, a fé não se prescreve, nem,
o que ainda é mais certo, se impõe. Não;
ela se adquire e ninguém há que esteja impedido de possuí-la, mesmo entre os
mais refratários. Falamos das verdades espirituais básicas e não de tal ou qual
crença particular. Não é à fé que compete procurá-los; a eles é que cumpre
ir-lhe, ao encontro e, se a buscarem sinceramente, não deixarão de achá-la.
Tende, pois, como certo que os que dizem: "Nada de melhor desejamos do que
crer, mas não o podemos", apenas de lábios o dizem e não do íntimo,
porquanto, ao dizerem isso, tapam os ouvidos. As provas, no entanto,
chovem-lhes ao derredor; por que fogem de observá-las? Da parte de uns, há
descaso; da de outros, o temor de serem forçados a mudar de hábitos; da parte
da maioria, há o orgulho, negando-se a reconhecer a existência de uma força
superior, porque teria de curvar-se diante dela.
Em
certas pessoas, a fé parece de algum modo inata; uma centelha basta para
desenvolvê-la. Essa facilidade de assimilar as verdades espirituais é sinal
evidente de anterior progresso. Em outras pessoas, ao contrário, elas
dificilmente penetram, sinal não menos evidente de naturezas retardatárias. As
primeiras já creram e compreenderam; trazem, ao renascerem, a intuição do que souberam: estão com a educação feita;
as segundas tudo têm de aprender: estão com a educação por fazer. Ela,
entretanto, se fará e, se não ficar concluída nesta existência, ficará em
outra.
A
resistência do incrédulo, devemos convir, muitas vezes provém menos dele do que
da maneira por que lhe apresentam as coisas. A fé necessita de uma base, base
que é a inteligência perfeita daquilo em que se deve crer. E, para crer, não
basta ver; é preciso, sobretudo, compreender. A fé cega já não é deste
século (1), tanto assim que precisamente o dogma da fé cega é que produz hoje o
maior número dos incrédulos, porque ela pretende impor-se, exigindo a abdicação
de uma das mais preciosas prerrogativas do homem: o raciocínio e o
livre-arbítrio. É principalmente contra essa fé que se levanta o incrédulo, e
dela é que se pode, com verdade, dizer que não se prescreve. Não admitindo
provas, ela deixa no espírito alguma coisa de vago, que dá nascimento à dúvida.
A fé raciocinada, por se apoiar nos fatos e na lógica, nenhuma obscuridade
deixa. A criatura então crê, porque tem certeza, e ninguém tem certeza senão porque
compreendeu. Eis por que não se dobra. Fé
inabalável só o é a que pode encarar de frente a razão, em todas as épocas da
Humanidade.
A
esse resultado conduz o Espiritismo, pelo que triunfa da incredulidade, sempre
que não encontra oposição sistemática e interessada.
(1) Kardec escreveu essa palavras no
século XIX. Hoje, o espírito humano tornou-se ainda maisexigente: a fé cega
está abandonada; reina descrença nas Igrejas que a impunham. As massas humanas
vivem sem ideal, sem esperança em outra vida e tentam transformar o mundo pela
violência. As lutas econômicas engedraram as mais exóticas doutrinas de ação e
reação. Duas guerras mundiais assolaram o planeta,numa ânsia furiosa de
predomínio econômico.Toda a esperança da Humanidade hoje se apóia no Espiritismo,
na restauração do Cristianismo, baseada em fatos que demonstram os princípios
básicos da Doutrina cristã: eternidade da vida, responsabilidade ilimitada de
pensamentos, palavras e atos. Sem a Terceira Revelação o mundo estaria
irremediavelmente perdido pelo choque das mais desencontradas ideologias
materialistas e violentistas. - A Editora da FEB, em 1948.
Parábola da figueira que secou
8. Quando saiam de Betânia, ele teve fome; e,
vendo ao longe uma figueira, para ela encaminhou-se, a ver se acharia alguma
coisa; tendo-se, porém, aproximado, só achou folhas, visto não ser tempo de
figos. Então, disse Jesus à figueira: Que ninguém coma de ti fruto algum, o que
seus discípulos ouviram. - No dia seguinte, ao passarem pela figueira, viram
que secara até á raiz. - Pedro, lembrando-se do que dissera Jesus, disse:
Mestre, olha como secou a figueira que tu amaldiçoaste. - Jesus, tomando a
palavra, lhes disse: Tende fé em Deus. - Digo-vos, em verdade, que aquele que
disser a esta montanha: Tira-te daí e lança-te ao mar, mas sem hesitar no seu
coração, crente, ao contrário, firmemente, de que tudo o que houver dito
acontecerá, verá que, com efeito, acontece. (S. MARCOS, cap. Xl, vv. 12 a 14 e
20 a 23.)
9. A
figueira que secou é o símbolo dos que apenas aparentam propensão para o bem,
mas que, em realidade, nada de bom produzem; dos oradores que mais brilho têm
do que solidez, cujas palavras trazem superficial verniz, de sorte que agradam
aos ouvidos, sem que, entretanto, revelem, quando perscrutadas, algo de substancial
para os corações. E de perguntar-se que proveito tiraram delas os que as
escutaram.
Simboliza
também todos aqueles que, tendo meios de ser úteis, não o são; todas as
utopias, todos os sistemas ocos, todas as doutrinas carentes de base sólida. O
que as mais das vezes falta é a verdadeira fé, a fé produtiva, a fé que abala
as fibras do coração, a fé, numa palavra. que transporta montanhas. São árvores
cobertas de folhas porém, baldas de frutos. Por isso é que Jesus as condena à
esterilidade, porquanto dia virá em que se acharão secas até à raiz. Quer dizer
que todos os sistemas, todas as doutrinas que nenhum bem para a Humanidade
houverem produzido, cairão reduzidas a nada; que todos os homens
deliberadamente inúteis, por não terem posto em ação os recursos que traziam
consigo, serão tratados como a figueira que secou.
10.
Os médiuns são os intérpretes dos Espíritos; suprem, nestes últimos, a falta de
órgãos materiais pelos quais transmitam suas instruções. Daí vem o serem
dotados de faculdades para esse efeito. Nos tempos atuais, de renovação social,
cabe-lhes uma missão especialíssima; são árvores destinadas a fornecer alimento
espiritual a seus irmãos; multiplicam-se em número, para que abunde o alimento;
há-os por toda a parte, em todos os países em todas as classes da sociedade,
entre os ricos e os pobres, entre os grandes e os pequenos, a fim de que em
nenhum ponto faltem e a fim de ficar demonstrado aos homens que todos são chamados. Se porém, eles
desviam do objetivo providencial a preciosa faculdade que lhes foi concedida,
se a empregam em coisas fúteis ou prejudiciais, se a põem a serviço dos
interesses mundanos, se em vez de frutos sazonados dão maus frutos se se
recusam a utilizá-la em beneficio dos outros, se nenhum proveito tiram dela para
si mesmos,melhorando-se, são quais a figueira estéril. Deus lhes retirará um
dom que se tornou inútil neles: a semente que não sabem fazer que frutifique, e
consentirá que se tornem presas dos Espíritos maus.
INSTRUÇÕES DOS ESPÍRITOS
A fé: mãe da esperança e da caridade
11.
Para ser proveitosa, a fé tem de ser ativa; não deve entorpecer-se. Mãe de
todas as virtudes que conduzem a Deus, cumpre-lhe velar atentamente pelo
desenvolvimento dos filhos que gerou.
A
esperança e a caridade são corolários da fé e formam com esta uma trindade
inseparável. Não é a fé que faculta a esperança na realização das promessas do
Senhor? Se não tiverdes fé, que esperareis? Não é a fé que dá o amor? Se não
tendes fé, qual será o vosso reconhecimento e, portanto, o vosso amor?
Inspiração
divina, a fé desperta todos os instintos nobres que encaminham o homem para o
bem. É a base da regeneração. Preciso é, pois, que essa base seja forte e
durável, porquanto, se a mais ligeira dúvida a abalar que será do edifício que
sobre ela construirdes? Levantai, conseguintemente, esse edifício sobre
alicerces inamovíveis. Seja mais forte a vossa fé do que os sofismas e as
zombarias dos incrédulos, visto que a fé que não afronta o ridículo dos homens
não é fé verdadeira.
A fé
sincera é empolgante e contagiosa; comunica-se aos que não na tinham, ou,
mesmo, não desejariam tê-la. Encontra palavras persuasivas que vão à alma. ao
passo que a fé aparente usa de palavras sonoras que deixam frio e indiferente
quem as escuta. Pregai pelo exemplo da vossa fé, para a incutirdes nos homens.
Pregai pelo exemplo das vossas obras para lhes demonstrardes o merecimento da
fé. Pregai pela vossa esperança firme, para lhes dardes a ver a confiança que
fortifica e põe a criatura em condições de enfrentar todas as vicissitudes da
vida.
Tende,
pois, a fé, com o que ela contém de belo e de bom, com a sua pureza, com a sua
racionalidade. Não admitais a fé sem comprovação, cega filha da cegueira. Amai
a Deus, mas sabendo porque o amais; crede nas suas promessas, mas sabendo
porque acreditais nelas; segui os nossos conselhos, mas compenetrados do um que
vos apontamos e dos meios que vos trazemos para o atingirdes. Crede e esperai
sem desfalecimento: os milagres são obras da fé. - José, Espírito protetor. (Bordéus, 1862.)
A fé humana e a divina
12.
No homem, a fé é o sentimento inato de seus destinos futuros; é a consciência
que ele tem das faculdades imensas depositadas em gérmen no seu íntimo, a
princípio em estado latente, e que lhe cumpre fazer que desabrochem e cresçam
pela ação da sua vontade.
Até
ao presente, a fé não foi compreendida senão pelo lado religioso, porque o
Cristo a exalçou como poderosa alavanca e porque o têm considerado apenas como
chefe de uma religião. Entretanto, o Cristo, que operou milagres materiais,
mostrou, por esses milagres mesmos, o que pode o homem, quando tem fé, isto é, a vontade de querer e a certeza de que
essa vontade pode obter satisfação. Também os apóstolos não operaram milagres,
seguindo-lhe o exemplo? Ora, que eram esses milagres, senão efeitos naturais,
cujas causas os homens de então desconheciam, mas que, hoje, em grande parte se
explicam e que pelo estudo do Espiritismo e do Magnetismo se tornarão
completamente compreensíveis?
A fé
é humana ou divina, conforme o homem aplica suas faculdades à satisfação das
necessidades terrenas, ou das suas aspirações celestiais e futuras. O homem de
gênio, que se lança à realização de algum grande empreendimento, triunfa, se
tem fé, porque sente em si que pode e há de chegar ao fim colimado, certeza que
lhe faculta imensa força. O homem de bem que, crente em seu futuro celeste,
deseja encher de belas e nobres ações a sua existência, haure na sua fé, na
certeza da felicidade que o espera, a força necessária, e ainda aí se operam
milagres de caridade, de devotamento e de abnegação. Enfim, com a fé, não há
maus pendures que se não chegue a
vencer.
O
Magnetismo é uma das maiores provas do poder da fé posta em ação. É pela fé que
ele cura e produz esses fenômenos singulares, qualificados outrora de milagres.
Repito:
a fé é humana e divina. Se todos os encarnados se achassem bem persuadidos da força
que em si trazem, e se quisessem pôr a vontade a serviço dessa força, seriam
capazes de realizar o a que, até hoje, eles chamaram prodígios e que, no entanto,
não passa de um desenvolvimento das faculdades humanas. Um Espírito Protetor. (Paris, 1863.)
FÉ
Léon Denis
A fé
é a confiança da criatura em seus destinos, é o sentimento que a eleva à
infinita Potestade, é a certeza de estar no caminho que vai ter à verdade. A fé
cega é como o farol cujo vermelho clarão não pode traspassar o nevoeiro; a fé
esclarecida é foco elétrico que ilumina com brilhante luz a estrada a
percorrer.
Ninguém
adquire essa fé sem ter passado pelas tribulações da dúvida, sem ter padecido
as angústias que embaraçam o caminho dos investigadores. Muitos param em
esmorecida indecisão e flutuam longo tempo entre opostas correntezas. Feliz
quem crê, sabe, vê e caminha firme. A fé então é profunda, inabalável, e o
habilita a superar os maiores obstáculos. Foi neste sentido que se disse que a
fé transporta montanhas, pois, como tais, podem ser consideradas as
dificuldades que os inovadores encontram no seu caminho, ou sejam as paixões, a
ignorância, os preconceitos e o interesse material
Geralmente,
considera-se a fé somente como crença em certos dogmas religiosos, aceitos sem
exame. Mas a verdadeira fé está na convicção que nos anima e nos arrebata para
os ideais elevados. Há a fé em si próprio, em uma obra material qualquer, a fé
política, a fé na pátria. Para o artista, para o pensador, a fé é o sentimento
do ideal, é a visão do sublime fanal aceso pela mão divina, nos alcantis
eternos, a fim de guiar a Humanidade ao Bem e à Verdade.
E'
cega a fé religiosa que anula a razão e se submete ao juízo dos outros, que
aceita um corpo de doutrina verdadeiro ou falso, e a ele se cativa totalmente
Na sua impaciência e nos seus excessos, a fé cega recorre facilmente à
perfídia, à subjugação, e conduz ao fanatismo.
Ainda
sob este aspecto, ela é um poderoso incentivo, pois tem ensinado os homens a se
humilharem e a sofrerem. Pervertida pelo espírito de domínio, ela tem sido a
causa de muitos crimes , mas, em suas conseqüências funestas , também deixa
transparecer as suas grandes vantagens.
Ora,
se a fé cega pôde produzir tais efeitos, o que não fará a fé esclarecida pela
razão, a fé que julga, discerne e compreende? Certos teólogos nos exortam a
desprezar a razão, a renegá-la, a rebatê-la.
Deveremos
por isso repudiá-la, mesmo quando ela nos mostra o bem e o belo? Esses teólogos
alegam os erros em que a razão caiu e parecem esquecer lastimosamente que a
razão foi quem descobriu esses erros e nos ajudou a corrigi-los.
A
razão é uma faculdade superior, destinada a esclarecer-nos sobre todas as coisas
e que, como todas as outras faculdades, se desenvolve e se aumenta pelo
exercício. A razão humana é um reflexo da Razão eterna. E, Deus em nos. disse
S. Paulo. Desconhecer-lhe o valor e a utilidade é menosprezar a natureza
humana, é ultrajar a própria Divindade. Querer substituir a razão pela fé é
ignorar que ambas são solidárias e inseparáveis, que se consolidam e se
vivificam uma à outra. A união de ambas abre ao pensamento um campo mais vasto:
harmoniza as nossas faculdades e nos traz a paz interna.
A fé
é mãe dos nobres sentimentos e dos grandes feitos. O homem profundamente firme
e convicto é imperturbável diante do perigo, do mesmo modo que nas tribulações.
Superior às lisonjas, às seduções, às ameaças, ao bramir das paixões, ele ouve
uma voz ressoar nas profundezas da sua consciência, instigando-o à luta,
encorajando-o nos momentos perigosos.
Para
produzir tais resultados, a fé precisa repousar na base sólida que lhe oferecem
o livre exame e a liberdade de pensamento. Em vez de dogmas e mistérios, cumpre
que ela só reconheça princípios decorrentes da observação direta, do estudo das
leis naturais. Tal é o caráter da fé espírita.
O ESPIRITISMO E A FÉ - OTAVIANO PEREIRA DA NEVES
"Fé
inabalável só é a que pode encarar de frente a razão, em todas as épocas da
humanidade" - Allan
Kardec.
A
Doutrina Espírita apresenta uma nova maneira de ver a Fé. Este é um ponto que
julgamos importante, pois enquanto as religiões procuram manipular as
consciências, incutindo idéias de medo, impondo comportamentos, reduzindo
consideravelmente o livre arbítrio, o Espiritismo deixa o pensamento fluir
livremente, o mais natural possível para que o indivíduo possa demonstrar toda
sua identidade e autenticidade.
A Fé
raciocinada deixa de possuir conotação de algo obtido por uma graça, por um
mistério que não pode ser explicado. Ela, portanto, difere de tudo o que
caracteriza a Fé religiosa, porque baseia-se na busca do entendimento e do
discernimento. A Fé religiosa firma-se nos dogmas que definem as religiões. A
Fé Espírita usa a razão e, por isto, pode criticar e examinar o objeto da Fé.
Há
uma lucidez maior dos conhecimentos adquiridos e uma melhor captação de
conhecimentos novos. A Fé Espírita é efeito e não causa. O indivíduo que a
possui já experienciou no passado no passado vivências, aprendizados, etc. que
hoje lhe transmitem toda uma certeza e confiança. Há uma visão global,
holística, das coisas; ou, porque não dizer, uma visão "guestaltica"
do todo.
Para
que se obtenha esta compreensão geral, aumentando-a paulatinamente, torna-se
necessário que a nossa inteligência esteja ativa, para podermos exercitá-la
através da vontade. Com a inteligência teremos facilidade de adquirir
conhecimentos novos e tornar presente ou consciente os já adquiridos. Estes,
serão sempre assoalho para o apoio de novas informações; assim, o poder de
análise e de síntese vai crescendo de forma que a cada passo o indivíduo tenha
nova compreensão, novos "insights", ou lampejos cada vez mais claros.
Assim
é a Fé Espírita, com características próprias e especiais, que a diferencia de
qualquer outra Fé. A Fé Espírita não é reducionista, não bloqueia a vontade nem
a expressão do ser humano; ao contrário, amplia a vontade e a capacidade de
expressão. O indivíduo fica livre para a escolha e com menos possibilidades de
ser manobrado ou manipulado.
Daí
Allan Kardec dizer que a Fé Espírita "não pode ser prescrita ou imposta,
por aquele que a tem, ninguém a poderá tirar e àquele que não a tem ninguém
poderá dar". Diz o Codificador que "a Fé é sinal evidente de
progresso". O Espiritismo, como Doutrina reencarnacionista e
evolucionista, tem na sua Fé uma conseqüência desse progresso que o indivíduo
vai pouco a pouco conquistando, vivenciando. O progresso vai facilitando
melhores elaborações em estágios sempre renovados.
Portanto,
Fé não se consegue como que "por um passe de mágica". Ela é a
certeza, a segurança e a confiança já conquistadas e que num dado momento o
indivíduo experiência. A Fé está relacionada a obras, assim, uns possuem mais
Fé, outros menos. Para a realização das obras - e das conquistas - é necessário
estudo e trabalho que resultam em experiência. O que se pode afirmar é que
haverá sempre uma nova tarefa a ser executada, a nos provar, a nos testar e,
assim, vamos obtendo maior firmeza na execução, ou seja, maior Fé.
Foi
dito, "a fé é mãe da esperança e da caridade", o que é facilmente
compreensível, porque todo aquele que a possui, conforme a Doutrina Espírita,
apresenta um sintoma de que já conquistou estágios importantes e, como tal, ela
já está incorporada ao seu acervo tornando-se natural a prática do amor e da
caridade.
A
importância do Espírita ter esse entendimento da Fé, o levará a vivenciar
melhor a atual existência, o aqui e agora, e a pautar todos os seus atos dentro
de uma moral e de uma ética elevada. O Espiritismo facilita a reparação dos
erros numa experimentação consciente e nisto está o fortalecimento da Fé. Todo
este entendimento nos conduzirá à certeza, à confiança e à esperança,
proporcionando-nos encarar de frente a razão em todas as épocas da humanidade.
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