FRANCISCO DE ASSIS
Pessoas
vão surgindo de diversos pontos trazendo nas mãos cartazes com notícias atuais
de variável tema, permitindo que toda a plenária consiga ler.
Caminham
ao centro do palco, mostram e logo saem. A última traz um cartaz na forma de
coração escrito: “Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz...”.(ao som de
pássaros).
Abre
a cortina: Francisco está em seu luxuoso quarto, vertido com roupas de grande
beleza, sua mente fervilhava idéias interminadas, pondo-se de joelhos falou:
Francisco: Pai
Celestial !...Sinto que nasci para alguma coisa, nesta Terra abençoada. Sou
como ave solitária, que o cansaço fez descer nesta região. A cidade de Assis
acolheu-me com carinho e nesta mansão desfruto do luxo; o ouro convida-me às
extravagâncias, que meu coração desaprova, querendo me convencer-me de que meu
caminho é diferente, e que devo fazer alguma coisa em favor dos surdos e cegos
que andam comigo...
Pai de
todas as coisas !... Que devo fazer ? Onde devo pisar ? Que devo comer ? Qual
deve ser minha maior preocupação ? Alivia, meu Deus, esta guerra que surgiu na
minha frágil mente. Eu quero a paz. !
Eu quero
ser útil, bom e agradável. Mas como fazê-lo ? Traça, meu Pai, em meu coração, o
Teu programa que eu seguirei fielmente. E permita que eu seja instrumento fiel
em Tuas sagradas mãos.
Sê
comigo, Mestre, para que eu seja inspirado; fala, pra que eu possa ouvir,
entendendo a Tua vontade. Toma minhas mãos nas Tuas, mostrando-me os campos de
trabalho, onde devo acionar os instrumentos de plantio...
(Aumenta-se
a música dos pássaros, com um circulador borrifar um perfume suave para tomar o
ambiente. Voz em of)
Cristo: Francisco
!...(pausa) Temer é cortar a comunicação com quem quer te ajudar. Duvidar é
fazer crescer dentro de si os obstáculos. Eu sou aquele que haveria de voltar
!... E volto, quantas vezes serem necessárias, aos corações dos homens de boa
vontade, desde quando abram as portas para que Eu possa me fazer presente e
dizer novamente: “A Paz seja convosco !...” Eu ainda continuo crucificado no
mundo. Tira-me da cruz! O prazer dos homens é me ver sofrendo; já é tempo de
mudança, e o começo é teu. Faze-te instrumento dessa paz, no seio dos homens!
Tem como dogma à fé, como
espada, o Amor e como clima, a Caridade; como Alegria, a servidão, como casa o
império terreno e como escola, a natureza; como alimento, também a palavra de
Deus, como luz, também o entendimento e a tua guerra, será estabelecer a paz!
Francisco!... Não deves, em tempo algum, esquecer o perdão; não deves temer as
ingratidões, a pobreza, nem tampouco a dor, pois esses são força de Deus.
Recebe todo o rebanho da Terra como irmãos, pois são todos filhos de Deus, com
os mesmos direitos de viver e trabalhar, em busca da felicidade. Ama a Deus
sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo, mas o respeito aos teus
pais da Terra não deve ser esquecido. Podes fazer muito, se interpretares o
chamado de Deus. Estarei ao teu lado, se abrires o teu coração pra que eu possa
falar claramente. Até breve.
(Com os olhos vertendo em lágrimas de alegria pelo
diálogo, levantou-se serenamente, toma um gole de água)
Francisco: Graça
a Deus!...Graças a Deus!... Não tenho dúvidas de que por processos que
desconheço, falei diretamente com o Cristo. Compreendi que tenho uma missão a
desempenhar junto aos homens, meus irmãos, e sei que Deus me guiará nos
caminhos tortuosos, assinalando o meu coração com a bandeira da vitória. Devo
começar por aqui, em minha casa. O que devo fazer no mundo, sabendo que os
maiores obstáculos estarão em meu próprio lar, a quem muito devo. Como lhe
ofertar gratidão, sem ofende-lo? Como abençoar seu empenho em meu favor,
colocando-me em posição contrária? Todavia, para quem tem fé e confiança na
Suprema Justiça, o impossível torna-se viável e eu vencerei, por amor à Justiça,
vivendo pra o amor.
(Francisco sai do seu quarto e começa a conversar com diversos
serviçais que estão correndo de um lado para outro, em ocupações variadas,
desde a limpeza ao preparo de alimento destinado aos servos sob severa
vigilância de vários feitores. Caminha até eles refletindo)
Francisco: Meu
Deus ! Por onde devo começar ? Quero fazer alguma coisa de bom em benefício da
humanidade !... Como é difícil ser útil Como é difícil compreender aos nossos
deveres diante da nossa consciência! Como é constrangedor a gente ver e sentir
a opressão nos outros! Não posso parar mais e as idéias fervilham em minha
mente, qual uma vasilha de água em demorada fervura. Sei que o destino me
reserva uma parcela de luta em favor dos que sofrem, e graças aos céus, não me
falta disposição.
(aproxima-se de Francisco um dos feitores)
Feitor: Às
tuas ordens, jovem senhor!... Trouxeste alguma ordem da parte de teu pai para
que seja executada? Ou os ventos que te trouxeram anunciam somente boas vindas
e esperanças para todos nós?
Francisco: Venho
da parte da Paz. Graça a Deus, os ventos que trouxeram são realmente os ventos
da Esperança.
Feitor: O
senhor tem alguma ordem?
Francisco: Tenho.
Os servos devem estar todos na hora da refeição, no casarão, sem que falte um.
Quero falar com eles.
Feitor: Eles
comem ao pé do serviço, é ordem do seu pai...
(cortando a frase do interlocutor)
Francisco: Faze
todos eles subirem hoje, para comer no casarão.
Feitor: Sim,
senhor! Sim, senhor! Eles irão.
(Francisco
se afasta de todos. Sai para meditar, apreciar a vida da natureza, árvores,
pássaros para no centro do palco. É envolvido por uma imensa paz ajoelha-se e
se põe a agradecer a Deus em oração. Novamente com um circulador borrifar um
perfume suave para tomar o ambiente.Voz em of)
Cristo: Francisco, não tentes mudar o
destino desses homens de uma só vez. Cada um está no lugar certo, pelo bem que
a natureza lhes quer. Os desígnios da Providência não falham, meu filho. E não
penses que eles se encontram desamparados, pois cada criatura recebe de acordo
com o plantio que fez em eras remotas. Qual de nós poderemos contrariar os
processos evolutivos das criaturas, organizados pela Inteligência Maior ?
Poderemos, sim, alivia-los sem violência, pois é para isso que estamos no meio
deles, revestindo-nos, de vez em quando, do mesmo lodo onde se encontram. Essa
é uma prisão benfeitora que eles, no futura, irão abençoar...
A tua tarefa é reunir milhares de
cirineus...E, o quanto puderes, ajuda-los nas subidas dos calvários da vida, sem
que eles o saibam, sem que o interesse te estimule e sem que a vaidade
entorpeça os teus sentimentos de Amor. Faze o bem, por sentires o Bem dentro de
ti.
(Francisco
ao centro ajoelhado surge outros “Franciscos” vestidos iguais a ele formando um
círculo com ele ao centro)
Francisco1: A teoria pode ser oferta santa de todos,
mas a prática é exclusivamente individual.
Francisco2: Se, por acaso, encontrares um homem
faminto, a simples descrição da comida o saciará ?
Francisco3: Se alguém com sede te procurar e usares o
dom da palavra da última moda, com encanto, matarás sua sede?
Francisco4: Se algum nu estender-te a mão, pedindo a
tua capa para lhe cobrir a nudez, os teus bons conselhos o vestirão?
(formado o
círculo em torno dele)
Francisco1: Tudo isso é muito valioso, mas quando
estiverem unidos a tais gestos, o exemplo e a vivência.
Francisco2: Podes fazer muito por quem tem fome,
menos comer por ele.
Francisco3: Podes fazer muito por quem tem sede,
menos beber por ele a água.
Francisco4: Podes fazer muito por quem tem sede,
menos vestir por ele.
(Os Francisco 1, 2, 3 e 4 dão-se as mãos formando
uma roda em torno do Francisco)
Franciscos: Quanto à caminhada com a cruz nos ombros,
a grande subida evolutiva, pertence a cada um; a iniciação espiritual
repitamos, é individual.
(o Feitor
soa o triângulo anunciando a hora do almoço e Francisco desperta do transe e os
demais Franciscos saem do palco enquanto os serviçais vão chegando para o
almoço)
Feitor: Subam todos para a sede, mas olhem
lá, sem barulhos. O filho do patrão quer falar com todos, o que para nós é uma
honra. Quero muito respeito e muita obediência! Vocês me conhecem...
(Francisco
olha para o Feitor desaprovando suas palavras aproxima dos serviçais como
filhos, olhando um a um. Pára diante de todos)
Francisco: Não
maltratem esses homens e mulheres, pois são, como nós outros, filhos de Deus.
Exijam deles somente o trabalho, que é dever de cada criatura, ofertam-lhes
regalias compatíveis com o labor de cada dia. Quando doentes, façam-nos
descansar e cuidem de trata-los com humanidade. Sejam amigos deles, procurando
compreender que a vida pertence a todos. Pedirei a Deus por cada um de vocês.
(Aproxima-se
de Francisco, Gustavo um dos feitores. E afastando-se dos outros)
Francisco: Olá,
Gustavo!
Gustavo: Senhor
Francisco, como vai? O senhor deve estar bem; jovem, rico, bonito, sendo
cortejado por mulheres lindas... O senhor é feliz. Quem dera fosse eu!
Francisco: Gustavo,
o nosso tesouro maior está depositado nos Céus...
Gustavo: Olha,
senhor Francisco!..(e apontou o dedo para uma cabaça) O senhor sabe o que tem
ali dentro?
Francisco: Certamente
que é água, Gustavo. A natureza é tão sábia, que além de nos doar água pura
para nos sustentar a vida do corpo, ainda faz a vasilha com as condições
exigidas, no sentido de manter essa mesma água, fresquinha e saudável.
Gustavo: Será
que tem alguém nos ouvindo ?
Francisco: Tem
Gustavo, é o Senhor ! O Senhor do céu, Gustavo. Deus, que tudo vê e tudo
escuta, mas não castiga a ninguém e ama todos com o mesmo ardor.
Gustavo: Então
vou contar ao senhor, um caso... Olha patrãozinho!...Aquela cabaça, era para
água.(e apontou o dedo para uma cabaça), mas o seu destino mudou; hoje está
cheia de óleo, que deverei derramar na minha saída, em todos esses fardos até
ao lado da porta, sem vestígios. Tarde da noite atearei fogo, por que não
agüento mais o seu pai. Já pela terceira vez ele cospe na minha cara, na vista
dos servos. Ele exige respeito, no entanto, não respeita ninguém. Desculpa-me,
mas seu pai é muito injusto.
Francisco: Gustavo,
não deves prejudicar o teu senhor, do modo que pretendes. É certo que estás
sendo lesado nos valores que a vida te confiou, mas nunca se esqueça que é
filho de Deus e fazes parte do seu grande rebanho. Se já chegaste até aqui com
esse fardo pesado, caminha mais um pouco, porque na verdade a tolerância que
porventura exercitas agora, adiante te abrirá muitas portas, por onde poderás
passar com mais facilidade, sentindo a vida e vivendo em Deus. O ódio que
parece querer pousar no teu coração escurecerá os teus dias, dificultando que
encontres os caminhos da luz.
Gustavo: Suas
palavras envolvem meu coração, nunca tinha ouvido falar ao bonito. Mas...
(Francisco
interrompe o interlocutor)
Francisco: Vê
como a maldade não reside em seu coração.
(Francisco
abraça Gustavo e esse começa a chorar de tanta emoção)
Francisco: Estás
querendo é defender-te dos ataques do teu senhor, e querendo dias melhores, no
entanto, não sabes por onde começar e, nessa perturbação, quer por meios
errados. Se começar revidando as esporas da prepotência, perderás, porque o
ódio gera ódio, rebenta-se na maior inimizade, e quando os transformamos em
amor, Deus nos premia com a paz.
Gustavo: Nunca
pensei que na família do carrasco pudesse nascer alma tão pura como o Senhor.
Sinto que deve estar sofrendo com esse modo de viver. Preciso de quem me ajude,
não sei mais o que pensar sobre mim, quero ter fé em alguma coisa, quero ter
esperança, menino Francisco!... (destampou em pranto) Só me resta fazer uma
coisa... Vou quebrar o símbolo do meu ódio...
(Gustavo
levanta pega uma madeira e vai em direção da cabaça em prantos desesperados,
mas Francisco o impede com muita brandura)
Francisco: Não
faça isso, Gustavo. Queres mostrar o teu arrependimento, destruindo? Quebrar
essa cabaça é mostrar que a vingança ainda ronda o teu coração. Por que quebrá-la ? Ela
somente te serviu, resguardando a água das impurezas para te saciar, em sempre
foi amiga fiel! Mesmo o óleo que nela se encontra poderá ser útil em alguma
candeia e, se perdeu o ambiente para guardar água pura, servirá para uma dona
de casa como depósito ao que queima para clarear a noite.
Gustavo: Senhor,
me ajude a entender...
Francisco: O
ódio e a vingança, na vasilha do coração, é como essa cabaça que era para água
e levou óleo. Após muito tempo é que poderá voltar a conduzir água potável,
porque o óleo se entranha nas fibras mais íntimas e tudo o que toca. No
entanto, se persistirmos no bem, tudo alcançaremos na paz de Deus e de Cristo.
Sê corajoso, porém, no tocante ao bem que podes fazer. Queiras ser homem, não
apenas pela linha de masculinidade que a vida te emprestou, mas para converter
a tristeza em alegria, a guerra em paz e o ódio em amor. Procurando mostrar a
tua força por todos os meios, no entanto, nunca te esqueças de dominar os teus
próprios impulsos de vingança, de inveja e de descrença.
(Gustavo
ajoelha-se e chora como criança, Francisco ajoelha-se diante dele. Gustavo pega
as mãos de Francisco e ampara o rosto molhado de lágrimas, ouve-se uma singela
música e novamente com um circulador borrifar um perfume suave para tomar o
ambiente. Voz em of)
Cristo: Esta
é mais uma prova , nosso Pai, de que criatura nenhuma é ruim. Desde quando lhe
ofertamos amor, a fera se transforma em humano, e esse se afigura ao anjo. O
que falta em quase toda a humanidade é compreender as necessidades de afeto de
uns para com os outros, sem que o egoísmo dele faça parte. Quanto custa um
pouquinho de amor, para com aqueles que nos rodeiam ? Quanto custa um pouquinho
de amor, que poderemos dar ao próximo? A verdadeira amizade, que começa nestes
minúsculos instantes de entendimento, só precisa que apareça alguém com a
devida coragem para valorizar e fazer expandir esse tesouro que herdamos pela
sua misericórdia, oh Pai. Assim, temos que reconhecer a necessidade urgente da
ação evangelizadora no Mundo. Identificar-se como agente da ação
transformadora.
(Equipe de música começa canta a música: “Pés descalços,
mãos marcadas, moradores das calçadas...” Enquanto entra crianças com cartazes
com fotos de pessoas sendo ajudadas)
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