Entre a Terra e o Céu_15_Além do sonho
CVDEE - Centro Virtual de Divulgação e Estudo do Espiritismo
Sala Virtual de Estudos Nosso Lar
Estudo das obras de André Luiz
Livro: Entre a Terra e o Céu
Capítulo XV Além do sonho
“Tornando a Esteves, Clarêncio ofereceu-lhe o braço amigo, mas o moço prorrompeu em súplica:
- Não me prendam! Não me prendam! Sou a vítima!...
O Ministro absteve-se de continuar em sua afetiva manifestação.
No passo vagaroso de quem carrega um fardo de aflição, o inimigo de Leonardo retirou-se para a via pública, regressando ao aconchego doméstico.
Seguimo-lo a pequena distância.
“Em momentos rápidos, achávamos diante dele, que se esforçava por rever o corpo físico.
O Ministro, sem molestá-lo, amparou-o afetuosamente, e Esteves, pouco a pouco, recuperou a calma natural.
“E o nosso instrutor reafirmou:
- Nosso amigo, ontem Esteves, hoje é Mário Silva, prosseguindo em sua vocação para a enfermagem. Ouçamo-lo por alguns momentos.
O moço atendeu às obrigações da higiene e, logo após, foi recebido em pequena sala do apartamento por simpática velhinha, em cujo olhar adivinhamos a ternura de mãe.
“- Sonhei que alguém me chamava, a distância, em voz alta, e, acreditando tratar-se de algum doente em estado grave, não vacilei. Corri ao apelo, mas ao invés de topar um quarto de enfermo, vi-me, de imediato, numa cela mal iluminada e úmida...
E, com os recursos de imaginação de que dispunha para corresponder às requisições da mente, o rapaz continuou:
- Era um perfeito cubículo de prisão, onde me surpreendi encarcerado, de repente, junto de um criminoso de mau aspecto e de infortunada mulher em pranto... Senti tanta simpatia pela moça desventurada, quanta aversão pelo réu de medonha catadura. Tive a impressão nítida de que nos conhecíamos. Um misto de ódio e sofrimento me tomou de assalto, junto deles, principalmente ao lado do infeliz, cujo olhar se me afigurava cruel... Perguntava, a mim mesmo, porque me não retirava de tão detestável presença, mas, enquanto o homem me repelia, a mulher me provocava o maior enternecimento... Por mais estranho que pareça, experimentava o desejo de agredi-lo e de acariciá-la ao mesmo tempo. ... Depois de palavras enérgicas e rápidas, o delegado trouxe, então, à cela outros ajudantes que arrastaram meu adversário para fora...
“A mãezinha contemplou-o, bondosa, e acrescentou:
- Meu filho, o sonho terá alguma relação com a nossa Zulmira? A mulher com quem simpatizou não seria, acaso, nossa velha amiga, e o homem que lhe inspirou tanta repugnância não poderia ser interpretado como sendo o esposo dela?
O rapaz cobriu-se de leve palidez, mostrou-se mais taciturno e falou triste:
- Quem sabe?
"O moço fixou um gesto de amargura e observou:
- Ora, mamãe, evitemos recordações sem proveito. Zulmira não deve reaparecer em minha memória e esse Amaro que ela desposou é um ponto negro em meu coração. Creio que o melhor sentimento para eles dois em minha vida íntima é o ódio com que os reúno em minha lembrança. ...
“E, transcorridos alguns instantes, ajuntou:
- Meu sonho foi um simples pesadelo. Alguma preocupação imprecisa ou alguma intoxicação alimentar...
A senhora sorriu, desapontada, e aduziu:
- Cá por mim, estou certa de que, à noite, reencontramos as pessoas que amamos ou detestamos. Nosso Espírito, no sono, procura os afetos ou os desafetos do caminho para acertar as próprias contas. Disso, não tenho qualquer dúvida.
“Dispunha-me à inquirição, quando o olhar de Clarêncio cruzou com o meu. Registrando-me a estranheza, informou:
- Já sei o teor de tuas interrogações. Realmente, o nosso novo amigo foi noivo de Zulmira, a senhora obsidiada que conhecemos. Pretendia desposá-la, mas foi preterido no coração dela por Amaro, que lhe deve assistência e carinho. O passado fala no presente. Acham-se enredados numa teia de compromissos que lhes reclamam resgate.
- E reencontrar-se-ão para o desdobramento das lutas redentoras em que se envolvem? - perguntou Hilário, admirado.
- Inevitavelmente - acentuou o instrutor com voz segura.
A dona da casa, mãe devotada e sensível, meditando no sonho do filho, embora movimentando automaticamente a vassoura, orava por ele, rogando a Jesus o abençoasse.
. . .
O pensamento em prece escapava-lhe da cabeça, como tênue esguicho de luz.
"Não convém incomodar nossos amigos no curso das obrigações diuturnas, provocando elucidações que seriam desagradáveis e fora de ocasião. Aguardemos a noite, porque enquanto o corpo físico se refaz a alma invariavelmente procura o lugar ou o objeto a que imanta o coração.
Ouvimos o orientador e aquietamo-nos.
Cabia-nos aguardar a noite, quando se estenderiam as nossas experiências."
QUESTÕES PARA ESTUDO
1. Esteves, como se viu, despertou perturbado, fatigado pela noite mal dormida. Que ensinamentos podemos extrair desse episódio?
2. Ao se ver diante de Leonardo e Antonina, Esteves, hoje Mário Silva, como ela, desmembrado pelo sono físico, registrou de imediato os sentimentos de ódio e amor que, respectivamente, nutria a cada um, devido aos acontecimentos que vivenciou com outra personalidade. Como o Espiritismo explica esse tipo de reação?
3. Por que Esteves teve uma visão do sonho distorcida da realidade, imaginando uma cela, delegado, guardas, etc?
4. O que significam as seguintes passagens extraídas do presente capítulo?
a) “... O passado fala no presente. Acham-se enredados numa teia de compromissos que lhes reclamam resgates."
b) “O pensamento em prece escapava-lhe da cabeça, como tênue esguicho de luz."
c) “... Aguardemos a noite, porque enquanto o corpo físico se refaz a alma invariavelmente procura o lugar ou o objeto a que imanta o coração."
Conclusão:
Após despertar do sono físico, Esteves, agora Mário Silva, se encontra ainda sob os efeitos da experiência vivida durante a emancipação do espírito. Narra à sua mãe o sonho que teve, enquanto a equipe de benfeitores espirituais analisa a situação e se prepara para novas experiências.
QUESTÕES PARA ESTUDO
1. Esteves, como se viu, despertou perturbado, fatigado pela noite mal dormida. Que ensinamentos podemos extrair desse episódio?
Como temos estudado em capítulos anteriores desta obra e das obras anteriormente estudadas, enquanto o corpo físico dorme, o espírito se liberta, parcial e temporariamente, passando a viver a vida espiritual. Nesses momentos, sem os embaraços do corpo físico, nada pode ser escondido. O espírito se revela como ele é, com suas conquistas e dificuldades. Esteves ainda não se libertara de sentimentos pouco elevados, como o ressentimento, o ódio e o desejo de vingança. Sua sintonia espiritual o atraiu àquele local, onde se encontrava seu algoz de outrora, que também o odiava.
Vivenciou, em conseqüência, momentos de tensão e troca de energias negativas. Ao despertar, trazia impresso em seu perispírito essas vibrações deletérias que absorveu razão por que acordou perturbado e com a sensação de cansaço físico, por uma noite mal dormida. Devemos extrair desse episódio o ensinamento de que, para que o sono do corpo físico possa cumprir a finalidade de restaurar-lhe as energias despendidas durante o dia, o espírito tem que viver, durante esse período, em ambientes saudáveis, praticando atos que contribuam para a sua elevação, evitando situações como a que Esteves vivenciou.
2. Ao se ver diante de Leonardo e Antonina, Esteves, hoje Mário Silva, como ela, desmembrado pelo sono físico, registrou, de imediato, os sentimentos de ódio e amor que, respectivamente, nutria a cada um, devido aos acontecimentos que vivenciou com outra personalidade. Como o Espiritismo explica esse tipo de reação?
Os corpos físicos eram outros, mas, os espíritos, com seus respectivos perispíritos, eram os mesmos de outrora.
O perispírito mantém registradas as vibrações e sensações experimentadas no passado e a elas reage no presente, quando despertados os fatos passados que as originaram. Ao se defrontar com os protagonistas do drama que vivenciara em sua encarnação anterior, Esteves sentiu a imediata reação negativa causada pela troca de vibrações negativas entre eles.
3. Por que Esteves teve uma visão do sonho distorcida da realidade, imaginando uma cela, delegado, guardas, etc?
A recordação, através do sonho, do que o espírito vivenciou durante o desdobramento pelo sono físico, depende do grau de evolução do espírito. Retomando o corpo físico, ocorre um esquecimento semelhante ao ocorrido durante o processo de reencarnação. Quanto mais evoluído é o espírito, menos influência sofre do organismo fisiológico, o que lhe permite uma recordação mais clara dos fatos vivenciados. Esteves, como temos visto, ainda não alcançara um patamar evolutivo elevado. Ainda sofria os embaraços do corpo físico. Não podendo ter uma recordação fiel do que ocorrera, sua mente imaginou aquela história.
4. O que significam as seguintes passagens extraídas do presente capítulo?
a) “... O passado fala no presente. Acham-se enredados numa teia de compromissos que lhes reclamam resgates."
É uma conseqüência da continuidade da vida do espírito. As experiências físicas se sucedem, mas a vida espiritual é uma só, única e contínua, a repercutir os efeitos dos atos praticados no curso da existência do espírito. O presente nada mais é do que uma continuação do passado e lei de causa e efeito é naturalmente acionada, para exigir o resgate dos equívocos de anterior encarnação.
b) “O pensamento em prece escapava-lhe da cabeça, como tênue esguicho de luz."
O pensamento se materializa e é levado por ondas fluido-magnéticas ao seu destino. A mãe de Esteves mantinha-se em prece e, como exteriorizava pensamentos bons, de sua cabeça escapavam o esguicho de luz a que se refere André Luiz
c) “... Aguardemos a noite, porque enquanto o corpo físico se refaz a alma invariavelmente procura o lugar ou o objeto a que imanta o coração."
Como dissemos acima, emancipado do corpo físico, sem as amarras que este o impõe, o espírito se mostra tal qual ele é, sem o véu que oculta seus sentimentos. Na vida espiritual, não há como disfarçar os sentimentos e o espírito vai se encontrar sempre com aqueles com quem têm afinidade. Por essa razão, Clarêncio quis aguardar a noite, para que pudesse conhecer a realidade vivida por cada um dos personagens do caso que cuidava.
Muita paz a todos.
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