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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Céu inferno_083_2ª parte cap. VIII - Expiações terrestres- Max, o mendigo

Em 1850, numa vila da Baviera, morreu um velho quase centenário, conhecido por pai Max. Por não possuir família, ninguém lhe determinava a origem. Havia cerca de meio século que se invalidara para ganhar a vida, sem outro recurso além da mendicidade, que ele dissimulava, procurando vender, pelas herdades e castelos, almanaques e outras miudezas. Deram-lhe a alcunha de conde Max, e as crianças o chamavam somente pelo título - circunstância esta que o fazia rir sem agastamento.

Por que esse título? Ninguém saberia dizê-lo. O hábito o sancionara. Talvez tivesse provindo da sua fisionomia, das suas maneiras, cuja distinção fazia contraste com a miserabilidade dos andrajos.

Muitos anos depois da morte, Max apareceu em sonho à filha do proprietário de um castelo em cuja estrebaria era outrora hospedado, porque não possuía domicílio próprio. Nessa aparição, disse ele: "Agradeço o terdes lembrado o pobre Max nas vossas preces, porque o Senhor as ouviu. Alma caritativa, que vos interessastes pelo pobre mendigo, já que quereis saber quem sou, vou satisfazer-vos, ministrando, ao mesmo tempo e a todos, um grande ensinamento. Há cerca de século e meio era eu um dos ricos e poderosos senhores desta região, porém orgulhoso da minha nobreza. A fortuna imensa, além de só me servir aos prazeres, mal chegava para o jogo, para o deboche, para as orgias, que eram a minha única preocupação na vida. Quanto aos vassalos, porque os julgasse animais de trabalho destinados a servir-me, eram espezinhados e oprimidos, para proverem as minhas dissipações. Surdo aos seus queixumes, como em regra também o era com todos os infelizes, julgava eu que eles ainda se deveriam ter por honrados em satisfazer-me os caprichos. Morri cedo, exausto pelos excessos, mas sem ter, de fato, experimentado qualquer desgraça real. Ao contrário, tudo parecia sorrir-me, a ponto de passar por um dos seres mais ditosos do mundo. Tive funerais suntuosos e os boêmios lamentavam a perda do ricaço, mas a verdade é que sobre o meu túmulo nenhuma lágrima se derramou, nenhuma prece por mim se fez a Deus, de coração, enquanto minha memória era amaldiçoada por todos aqueles para cuja miséria contribuíra. Ah! E como é terrível a maldição dos que prejudicamos! Pois essa maldição não deixou de ressoar-me aos ouvidos durante longos anos que me pareceram uma eternidade. Depois, por morte de cada uma das vitimas, era um novo espectro ameaçador ou sarcástico que se erguia diante de mim, a perseguir-me sem tréguas, sem que eu pudesse encontrar um vão esconso onde me furtasse às suas vistas! Nem um olhar amigo! Os antigos companheiros de devassidão, infelizes como eu, fugiram, parecendo dizer-me desdenhosos: "Tu não podes mais custear os nossos prazeres."

Oh! Então, quanto daria eu por um instante de repouso, por um copo d’água para saciar a sede ardente que me devorava! Entretanto eu nada mais possuía, e todo o ouro a jorros derramado sobre a Terra não produzia uma só bênção, uma só que fosse... Ouviste, minha filha?!

Cansado por fim, opresso, qual viajor que não lobriga o termo da jornada, exclamei: "Meu Deus, tende compaixão de mim! Quando terminará esta situação horrível?"

Então uma voz - primeira que ouvi depois de haver deixado a Terra - disse: "Quando quiseres." Que será preciso fazer, grande Deus? - repliquei. Dizei-o, que a tudo me sujeitarei. - "É preciso o arrependimento, é preciso te humilhares perante os mesmos a quem humilhastes; pedir-lhes que intercedam por ti, porque a prece do ofendido que perdoa é sempre agradável ao Senhor." 

Conclusão:

1. Com certeza, as penas eternas, que compõem dogmas religiosos sem lógica e irracionais, levando-se em conta a natureza de Deus, não têm mais guarida nos corações da maioria dos homens. Porém, não ficamos mais irresponsáveis, muito pelo contrário. Ao nos darmos conta de que as penas são as consequências das nossas próprias ações, obedecendo a uma lei natural de ação e reação, a qual todos compreendem, nos leva a um maior senso de responsabilidade, pautada na luz da razão.

Esta visão lógica e racional da lei natural a qual estamos sujeitos nos consola e nos dá esperanças no futuro, pois embora muito tenhamos errado, temos empre mais uma chance de refazer o caminho e nos retratarmos.

2. Ele poderia ter utilizado a riqueza e a posição social - "empréstimos" de Deus - para aliviar a miséria dos irmãos menos afortunados neste aspecto. Poderia ter sido humilde e caridoso e, com certeza, teria "economizado" tempo e expiação no futuro. 

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