O
que é, afinal, o casamento?
Sonia
Dutra
Minha
experiência de vida poderia, simploriamente, dizer que casamento é
aquilo onde quem está dentro quer sair e quem está fora quer
entrar.
O
casamento poderia ser visto como uma sonhada viagem para a qual duas
pessoas levam sua mala individual, mas vão precisar construir e
arrumar uma nova mala: a do Nós,
na
qual entrarão coisas de um e de outro, mas muito também terá de
ser deixado para trás.
Quando
as pessoas não atentam para suas diferenças, o casamento reflete
uma união torturante, onde duas pessoas passam a se alimentar de uma
relação doente de desatenção, indiferença e silêncio. Surgem,
na convivência, medos, incompreensões, distanciamentos e traições.
O
mundo do casal se torna como um campo de violência e competição.
É
o casamento sem casamento.
Hoje,
mais do que nunca, todos querem apenas ganhar, sem abrir mão das
suas possibilidades de encontrar o prazer. Desejamos novos modelos de
relação, como as vantagens das uniões antigas, porém sem suas
desvantagens.
Buscamos
um amor que sobreviva a novos amores, que seja tudo e muito mais.
Deparamo-nos com casais que se amam num dia e, no outro, são
inimigos em campo de guerra, onde tudo - família, filhos, profissão
- são disputas.
Hoje,
a falta de compromisso é a marca da maioria dos casais cujo objetivo
principal é a busca do prazer individual. Diante de um egoísmo
profundo, as relações são breves, superficiais e sem envolvimento
emocional de fato.
Wilhelm
Reich nos diz que “o vínculo com o parceiro se dá a partir de
responsabilidade e desejos internos, e não através de coerções
sociais”.
A
fidelidade no casamento, portanto, não deve passar apenas pela
sexualidade, mas sim pelo quanto que o casal está disposto a
respeitar os seus compromissos de encontro existencial.
O
casal que faz de sua união um espaço de vida compartilhado como
amantes, esposos, amigos íntimos, pais, irmãos, confidentes,
cúmplices, desenvolve a maior de todas as parcerias, aquela que
resgata suas dificuldades de outras vidas sem comprometer as vidas
futuras. Esta incrível completude, com base numa disponibilidade
amorosa grande, dá ao casamento um tom de grande empreendimento,
muito mais espiritual do que material.
O
casamento deixa de ser baseado em pactos e contratos para se basear
em sentimentos de amor e atração sexual.
O
desejo de estar
junto com passa
a ser prioritário, e com ele a vontade de conquistar e reconquistar
a cada dia. Tudo isso dá à união uma categoria melhor, e maior é
o aprendizado em cumplicidade, respeito, negociação, compromisso e
escolha.
É,
pois, o casamento uma construção trabalhosa, tal qual todo ato
criativo do ser humano, trazendo medos, inseguranças, desejos,
conflitos.
Mas
ainda assim não queremos abrir mão do doce sonho de felicidade que
só o amor pode trazer.
Há
entre o homem e a mulher algo que lhes dá a possibilidade de uma
relação de bem-querer, aconchego, ternura e sensualidade, que é o
amor.
Paixão
é sentimento inicial e provisório e se transforma no tempo.
O
amor é um sentimento amplo e duradouro que, para sobreviver, deve
conter os resíduos da paixão original. É o amor que determina o
desejo de estabelecer vínculos estáveis com outra pessoa; exigência
de uma vida compartilhada, de intimidade, de projetos comuns,
respeito às mudanças individuais, crescimento a dois.
O
amor é o que nos faz ter mais coragem para viver o desafio da
comunhão. O amor não é por si só a solução, mas é sim, sem
dúvida, um modo de abertura para o outro sem igual, pois é capaz de
sustentar conflitos e desigualdades e trazer o maior de todos os
desafios: a destinação do ser humano para a liberdade e felicidade.
O caminho do amor é impresso no coração do homem.
Como
diz Joanna de Angelis em “Amor, Imbatível Amor”:
“...
[o amor] é fonte inexaurível de energias capazes de modificar todas
as estruturas comportamentais do ser humano.
...
Variando de expressão e de dimensão em todos os seres, é sempre o
mesmo impulso divino que brota e se agiganta, necessitando do
direcionamento que a razão oferece, a fim de superar as barreiras do
ego e tornar-se humanista, humanitarista, plenificador, sem
particularismo, sem paixão, livre como o pensamento e poderoso
quanto a força da própria vida.”
O jornal
O
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Ano
4 Nº 13 janeiro/março 2005
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