Ocorre
separação entre cônjuges espirituais?
Pode
acontecer, por exemplo, que as autoridades superiores escolham um dos
cônjuges para serviço particular entre os homens, atendendo a
qualidades especiais que possua e com que deva satisfazer a questões
e eventualidades terrestres.
Além
disso, esse ou aquele cônjuge, após venturoso estágio na esfera
superior, necessita regressar aos círculos carnais para experiências
difíceis no resgate de compromissos determinados.
Em
ambas as modalidades de separação compreensível e justa, o
companheiro ou a companheira em condição de superioridade, pelo
menos circunstancialmente, roga, com êxito, a possibilidade de
custodiar o objeto de sua veneração e de seu carinho, quase sempre
na posição de reencarnados, em regime de completa renúncia.
(Evolução
em Dois Mundos, Parte II, IX, André Luiz/Chico Xavier/Waldo Vieira,
FEB)
O
CASO TOBIAS - No terceiro dia de trabalho, alegrou-me Tobias com
agradável surpresa. Findo o serviço, ao entardecer, de vez que
outros se incumbiram da assistência noturna, fui fraternalmente
levado à residência dele, onde me aguardavam belos momentos de
alegria e aprendizado.
Logo de entrada, apresentou-me duas senhoras, uma já idosa e outra bordejando a madureza. Esclareceu que esta era sua esposa e aquela, irmã. Luciana e Hilda, afáveis e delicadas, primaram em gentilezas.
Reunidos na formosa biblioteca de Tobias, examinamos volumes maravilhosos na encadernação e no conteúdo espiritual.
Logo de entrada, apresentou-me duas senhoras, uma já idosa e outra bordejando a madureza. Esclareceu que esta era sua esposa e aquela, irmã. Luciana e Hilda, afáveis e delicadas, primaram em gentilezas.
Reunidos na formosa biblioteca de Tobias, examinamos volumes maravilhosos na encadernação e no conteúdo espiritual.
A
senhora Hilda convidou-me a visitar o jardim, para que pudesse
observar, de perto, alguns caramanchões de caprichosos formatos.
Cada casa, em "Nosso Lar", parecia especializar-se na
cultura de determinadas flores. Em casa de Lísias, as glicínias e
os lírios contavam-se por centenas; na residência de Tobias, as
hortênsias inumeráveis desabrochavam nos verdes lençóis de
violetas. Belos caramanchões de árvores delicadas, recordando o
bambu ainda novo, apresentavam no alto uma trepadeira interessante,
cuja especialidade é unir frondes diversas, à guisa de enormes
laços floridos, na verde cabeleira das árvores, formando gracioso
teto.
Não
sabia traduzir minha admiração. Embalsamava-se a atmosfera de
inebriante perfume. Comentávamos a beleza da paisagem geral, vista
daquele ângulo do Ministério da Regeneração, quando Luciana nos
chamou ao interior, para leve refeição.
Encantado
com o ambiente simples, cheio de notas de fraternidade sincera, não
sabia como agradecer ao generoso anfitrião.
A
certa altura da palestra amável, Tobias acrescentou, sorridente:
-
O meu amigo, a bem dizer, é ainda novato em nosso Ministério e
talvez desconheça o meu caso familiar.
Sorriam
ao mesmo tempo as duas senhoras; e, observando-me a silenciosa
interpelação, o dono da casa continuou:
-
Aliás, temos numerosos núcleos nas mesmas condições. Imagine que
fui casado duas vezes...
E,
indicando as companheiras de sala, prosseguiu num gesto de bom
humor:
humor:
-
Creio nada precisar esclarecer quanto às esposas.
-
Ah! sim - murmurei extremamente confundido -, quer dizer que as
senhoras Hilda e Luciana compartilharam das suas experiências na
Terra...
-
Isso mesmo - respondeu tranqüilo.
Nesse
ínterim, a senhora Hilda tomou a palavra, dirigindo-se a mim:
-
Desculpe o nosso Tobias, irmão André. Ele está sempre disposto a
falar do passado, quando nos encontramos com alguma visita de
recém-chegados da Terra.
-
Pois não será motivo de júbilo - aduziu Tobias bem-humorado -,
vencer o monstro do ciúme inferior, conquistando, pelo menos, alguma
expressão de fraternidade real?
-
De fato - objetei -, o problema interessa profundamente a todos nós.
Há milhões de pessoas, nos círculos do planeta, em estado de
segundas núpcias. Como resolver tão alta questão afetiva,
considerando a espiritualidade eterna? Sabemos que a morte do corpo
apenas transforma sem destruir. Os laços da alma prosseguem, através
do Infinito. Como proceder? Condenar o homem ou a mulher que se
casaram mais de uma vez? Encontraríamos, porém, milhões de
criaturas nessas condições. Muitas vezes já lembrei, com
interesse, a passagem evangélica em que o Mestre nos promete a vida
dos anjos, quando se referiu ao casamento na Eternidade.
-
Forçoso é reconhecer, todavia, com toda a nossa veneração ao
Senhor - atalhou o anfitrião, bondoso -, que ainda não nos achamos
na esfera dos anjos e, sim, dos homens desencarnados.
-
Mas, como solucionar aqui semelhante situação? - perguntei.
Tobias
sorriu e considerou:
-
Muito simplesmente; reconhecemos que entre o irracional e o homem há
enorme série gradativa de posições. Assim, também, entre nós
outros, o caminho até o anjo representa imensa distância a
percorrer.
Ora,
como podemos aspirar à companhia de seres angélicos, se ainda não
somos nem mesmo fraternos uns com os outros? Claro que existem
caminheiros de ânimo forte, que se revelam superiores a todos os
obstáculos da senda, por supremo esforço da vontade; mas a maioria
não prescinde de pontes ou do socorro de guardiães caridosos. Em
vista dessa verdade, os casos dessa natureza são resolvidos nos
alicerces da fraternidade legítima, reconhecendo-se que o verdadeiro
casamento é de almas e essa união ninguém poderá quebrantar.
Nesse
instante, Luciana, que se mantinha silenciosa, interveio,
acrescentando:
-
Convém explicar, todavia, que tudo isso, felicidade e compreensão,
devemos ao espírito de amor e renúncia de nossa Hilda.
A
senhora Tobias, no entanto, demonstrando humildade digna, acentuou:
-
Calem-se. Nada de qualidades que não possuo. Buscarei sumariar nossa
história, a fim de que nosso hóspede conheça meu doloroso
aprendizado.
E
continuou, depois de fixar um gesto de narradora amável:
-
Tobias e eu nos casamos na Terra, quando ainda muito jovens, em
obediência a sagradas afinidades espirituais. Creio desnecessário
descrever a felicidade de duas almas que se unem e se amam
verdadeiramente no matrimônio. A morte, porém, que parecia
enciumada de nossa ventura, subtraiu-me do mundo, por ocasião do
nascimento do segundo filhinho.
Nosso
tormento foi, então, indescritível. Tobias chorava sem remédio, ao
passo que eu me via sem forças para sufocar a própria angústia.
Pesados dias de Umbral abateram-se sobre mim. Não tive remédio
senão continuar agarrada ao marido e ao casal de filhinhos, surda a
todo esclarecimento que os amigos espirituais me enviavam, por
intuição.
Queria
lutar, como a galinha ao lado dos pintainhos. Reconhecia que o esposo
necessitava reorganizar o ambiente doméstico, que os pequeninos
reclamavam assistência maternal. Tornava-se a situação francamente
insuportável. Minha cunhada solteira não tolerava as crianças e a
cozinheira apenas fingia dedicação. Duas amas jovens pautavam toda
a conduta pessoal pela insensatez. Não pôde Tobias adiar a solução
justa e, decorrido um ano da nova situação, desposou Luciana,
contrariando meus caprichos. Ah! se soubesse como me revoltei!
Semelhava-me a uma loba ferida. Minha ignorância deu até para lutar
com a pobrezinha, tentando aniquilá-la. Foi aí que Jesus me
concedeu a visita providencial de minha avó materna, desencarnada
havia muitos anos. Chegou ela como quem nada desejava, enchendo-me de
surpresa, sentou-se a meu lado, pôs-me em seguida ao colo, como
noutro tempo, e perguntou-me lacrimosa: - "Que é isso, minha
neta? Que papel é o seu na vida? Você é leoa ou alma consciente de
Deus? Pois nossa irmã Luciana serve de mãe a seus filhos, funciona
como criada de sua casa, é jardineira do seu jardim, suporta a bílis
do seu marido e não pode assumir o lugar provisório de companheira
de lutas, ao lado dele? É assim que o seu coração agradece os
benefícios divinos e remunera aqueles que o servem? Quer você uma
escrava e despreza uma irmã? Hilda! Hilda! onde está a religião do
Crucificado que você aprendeu? Oh! minha pobre neta, minha
pobre!..." Abracei-me, então, em lágrimas, com a velhinha
santa e abandonei o antigo ambiente doméstico, vindo em companhia
dela para os serviços de "Nosso Lar". Desde essa época,
tive em Luciana mais uma filha. Trabalhei, então, intensamente.
Consagrei-me ao estudo sério, ao melhoramento moral de mim mesma,
busquei ajudar a todos, sem distinção, em nosso antigo lar
terrestre. Constituiu Tobias uma família nova, que passou a me
pertencer, igualmente, pelos sagrados laços espirituais. Mais tarde,
voltou ele, reunindo-se a mim, acompanhado de Luciana, que veio
também ter conosco para nossa completa alegria. E aí tem, meu
amigo, a nossa história...
Luciana,
contudo, tomou a palavra e observou:
-
Não disse ela, porém, quanto se tem sacrificado, ensinando-me com
exemplos.
-
Que dizes, filha? - perguntou a senhora Tobias, acariciando-lhe a
destra.
Luciana
sorriu e ajuntou:
-
Mas, graças a Jesus e a ela, aprendi que há casamento de amor, de
fraternidade, de provação, de dever, e, no dia em que Hilda me
beijou, perdoando-me, senti que meu coração se libertara desse
monstro que é o ciúme inferior. O matrimônio espiritual
realiza-se, alma com alma, representando os demais simples
conciliações indispensáveis à solução de necessidades ou
processos retificadores, embora todos sejam sagrados.
-
E assim construímos nosso novo lar, na base da fraternidade legítima
– acrescentou o dono da casa.
Aproveitando
o ligeiro silêncio que se fizera, indaguei:
-
Mas como se processa o casamento aqui?
-
Pela combinação vibratória - esclareceu Tobias, atencioso -, ou
então, para ser mais explícito -, pela afinidade máxima ou
completa.
Incapaz de sopitar a curiosidade, esqueci a lição de bom-tom e interroguei:
Incapaz de sopitar a curiosidade, esqueci a lição de bom-tom e interroguei:
-
Mas, qual a posição de nossa irmã Luciana neste caso?
Antes, porém, que os cônjuges espirituais respondessem, foi a própria interessada que explicou:
Antes, porém, que os cônjuges espirituais respondessem, foi a própria interessada que explicou:
-
Quando desposei Tobias, viúvo, já devia estar certa de que, com
todas as probabilidades, meu casamento seria uma união fraternal,
acima de tudo. Foi o que me custou a compreender. Aliás, é lógico
que, se os consortes padecem inquietação, desentendimento,
tristeza, estão unidos fisicamente, mas não integrados no
matrimônio espiritual.
Queria
perguntar mais alguma coisa; entretanto, não encontrava palavras que
revelassem ausência de impertinente indiscrição. A senhora Hilda,
contudo, compreendeu-me o pensamento e explicou:
-
Fique tranqüilo. Luciana está em pleno noivado espiritual. Seu
nobre companheiro de muitas etapas terrenas precedeu-a há alguns
anos, regressando ao círculo carnal. No ano próximo, ela seguirá
igualmente ao seu encontro. Creio que o momento feliz será em São
Paulo.
Sorrimos
todos alegremente.
Nesse
instante, Tobias foi chamado à pressa, para atender a um caso grave
nas Câmaras de Retificação.
Era
preciso, desse modo, encerrar a palestra.
(Nosso
Lar, cap. 38, André Luiz/Chico Xavier, FEB)
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