“As
reuniões Espíritas oferecem grandíssimas vantagens, por permitirem
que os que nelas tomam parte se esclareçam, mediante a permuta das
idéias, pelas questões e observações que se façam, das quais
todos aproveitam. Mas, para que produzam todos os frutos desejáveis,
requerem condições especiais, que vamos examinar, porquanto erraria
quem as comparasse às reuniões ordinárias.”
O
Livro dos Médiuns – cap. XXIX – item 324
O
episódio cristão da traição de Judas encerra infindáveis
leituras e lições às nossas considerações.
Jesus
sabia que o fato ocorreria, mas nem por isso tomou uma atitude
excludente. Mesmo sabendo da diferente postura do apóstolo,
manteve-se firme nos ideais de amá-lo incondicionalmente na sua
peculiar diferença.
Isso
é alteridade: o
estabelecimento de uma relação de paz com os diferentes, a
capacidade de conviver bem com a diferença da qual o “outro” é
portador.
A
ética da alteridade consiste basicamente em saber lidar com o
“outro”, entendido aqui não apenas como o próximo ou outra
pessoa, mas, além disso, como o diferente, o oposto, o distinto, o
incomum ao mundo dos nossos sentidos pessoais, o desigual, que na sua
realidade deve ser respeitado como é e como está, sem indiferença
ou descaso, repulsa ou exclusão, em razão de suas particularidades.
Alteridade,
portanto, torna-se aprendizado urgente para o futuro de nosso
Movimento Social Espírita, considerando o lamentável processo de
exclusão que vem ocorrendo na surdina das fileiras de serviço
cristão e espírita, em função de uma homogeneidade utópica.
Conviver
com os contrários e aprender a amá-los na sua diversidade constitui
desafio ético aos grupamentos espiritistas no campo da alteridade,
mesmo porque o mastro da nova revelação cristã preconiza a
fraternidade como postura de base para relações pacíficas e
mantenedoras do idealismo superior, em direção às clareiras de
necessidades do homem do terceiro milênio.
A
inclusão, em nome do Amor, é ação moral para nossa convivência,
sem o que não faremos a dolorosa e imprescindível cirurgia de
extirpação da egolatria, tão comum a todos nós – almas com
pequenas aquisições nos valores essenciais da espiritualização.
Diferenças
não são defeitos ou álibis para que decretemos o sectarismo e a
indiferença, somente porque não compreendemos o papel dos
diferentes na engrenagem da vida, executando uma “missão
específica” que, quase sempre, só conseguiremos entender quando,
decididamente, vencermos as etapas do processo de construção da
alteridade.
Sem
deixar de considerar as inúmeras variações que resultam das
peculiaridades individuais, apresentemos algumas dessas etapas na
caracterização do processo alteritário, tais como:
CONHECER
A DIFERENÇA –
é a fase de acolhimento do “outro”, despindo-se de preconceitos
e “estereótipos éticos” pré-formulados, guardando abertura de
afeto ao diferente e à sua diferença. 8
COMPREENDER
A DIFERENÇA –
criação de avaliações parciais, não definitivas, que favoreçam
a análise desse “outro”, buscando entender-lhe as razões,
estudar-lhe os motivos até penetrarmos na essência de seu “ser”,
compreendendo-o pela apreensão do “sentido” que ele tem para
Deus, seu papel cooperativo no universo.
APRENDER
COM A DIFERENÇA –
é uma fase que une e permite acessibilidade mútua, receptividade
aos sentidos do “outro”; propicia uma relação de aprendizado e
o elastecimento de noções sobre como a diversidade do outro pode
nos ensinar algo, buscando, se possível, aprender a amá-lo na sua
particularidade.
Fácil
concluir, portanto, que alteridade pode estar presente nos atos de
solidariedade, empatia e respeito nas relações em sociedade, sem
que, necessariamente, o Amor legítimo esteja na base de tais
atitudes. Por outro lado o Amor é sempre rico de alteridade e não
existe sem ela.
A
faina doutrinária conduz-nos a contínuos relacionamentos com
companheiros de entendimentos diversos e, inclusive, oponentes como
ocorre na vida social, embora não devam as reuniões espíritas
tornarem-se assembléias ordinárias, aderindo a relações de insana
competição ou de cruel indiferença.
O
processo de alteridade será valioso nas interações entre
companheiros de ideal e ocasionará, parafraseando o Codificador,
“grandíssimas vantagens”.
Investir
no entendimento de semelhante questão auxiliar-nos-á a estabelecer
uma autosondagem frente aos testemunhos da vida relacional,
investigando em nós mesmos, a partir dos atritos e desencontros com
o “outro”, as causas reais dos sentimentos que se assomaram no
caleidoscópio do mundo emocional, efetuando uma viagem segura a um
“outro diferente”, ainda não dominado e também desconhecido que
reside em nossa intimidade.
Esse
“outro diferente” é o “eu Divino” que resgataremos no
aprendizado do auto-Amor, possibilitando-nos, a partir dessa
conquista, excursionarmos ao mundo alheio, sem tisnar com as sombras
do primarismo moral os elos de Amor que devemos entreter com todos e
com tudo, em favor do soerguimento de um mundo melhor e com mais paz,
uns perante os outros.
Não
olvidemos, portanto, laborar por mais sólida preparação ética em
nossos conjuntos doutrinários, tratando das temáticas que versem
sobre a edificação de relacionamentos consistentes, com alteridade,
estudando o significado de compreender e aceitar, reflexionando com
demora no que seja saber criticar e discordar sem inimizade, sem
oposição sistemática e dissidência declarada, sabendo discordar
sem amar menos, apesar de pensar diversamente.
Mesmo
que nos agastemos inicialmente pela ausência do hábito de conviver
harmoniosamente com conflitos e tribulações da vida interpessoal,
anelemos por novos comportamentos repletos de Amor e alteridade,
aprendendo a maleabilidade, o altruísmo, a assertividade, o domínio
emocional e os imperativos de vigilância sobre os impulsos menos
bons, que serão promissoras sendas na conquista da ética da
alteridade.
Evidentemente,
não fazemos apologia ao convívio no círculo estreito de desafetos,
em climas adversos; privilegiemos os afins como quesito fundamental
ao bom andamento dos compromissos assumidos, aprendendo que
afinidades são “lembretes” de Deus, a fim de não esquecermos o
desejo de amar, e estímulos para a alegria da amizade.
Contudo,
não desconsideremos que o aprendizado do Amor autêntico, a
sedimentação da conduta amorosa é arregimentada na “fusão”
relacional com os menos afins, os que não nos atraem, com os quais
superaremos, paulatinamente, pesada fortaleza de entraves emocionais,
libertando-nos para vôos mais amplos pelos céus universais
pulsantes de Amor Divino, na vitória sobre o egoísmo que ainda nos
aprisiona.
*****
Amigo
dirigente,
A
responsabilidade que te cabe junto aos ofícios doutrinários é de
inestimável valor.
Difundir
esperança, promoção humana, delegação de responsabilidades e
estímulo para viver são alguns dos inúmeros deveres a ti
confiados, quando assumes os postos da direção espírita.
Pensa
e medita em teus desafios.
Estás
no cargo que te “onerará” com graves ocorrências na medida das
tuas necessidades de aprendizado.
Não
fujas da ocasião e faze o melhor que puderes.
Nos
terrenos do afeto com aqueles que te rodeiam, vigia tuas
manifestações de carinho e atenção avaliando os efeitos de tuas
ações, continuadamente.
Alteridade
para ti será o desafio de aceitares cada pessoa em tua experiência
evolutiva, auxiliando-a a crescer e se libertar.
Se
guardares contigo os preconceitos e estereótipos, ainda que
manifestes afeto e reconhecimento aos que te rodeiam, certamente
obliterarás o ciclo espontâneo das relações que devem vigorar em
teus ambientes de esforço. As pessoas à tua volta nem sempre
saberão traduzir a linguagem universal dos sentimentos que as
envolvem, perceberão, porém, o “hiato”, a reserva com que são
tratadas...
Afeto
para ser Divino precisa ser espontâneo, autêntico, natural.
Se
guardas dificuldades em entender esse ou aquele companheiro, se não
admites determinadas expressões comportamentais que diferenciam de
tua formação doutrinária, se não compreendes determinadas idéias
que a ti parecem desconexas da proposta espírita, tenha muito
discernimento para que não te aprisiones aos grilhões do
personalismo que subtrai-te a alteridade, a capacidade de
entendimento com o outro.
Os
dirigentes espíritas conscientes na atualidade precisarão de muita
alteridade para cumprir sua missão a contento.
Razão
pela qual, mais que nunca, aprendas o que seja promover e delegar, a
fim de permitires aos que te cruzam as vivências encontrarem o
quanto antes, com o preparo elementar, os caminhos adequados de
crescimento que nem sempre serão ao teu lado.
Liberta-te
da idéia de uniformidade e ajuda cada qual a descobrir o seu caminho
para Deus, sem jamais esquecer que cada criatura tem o seu Roteiro
Divino. 10
“Encontros
de Atitudes de Amor”
Grupo
Fraternidade Espírita João Ramalho
Reunião
do dia 6 de julho de 2008
Tema
Central:
Alteridade
A
convivência adequada com a diferença, com os diferentes
Textos
que servirão de base para as reflexões a respeito do tema central:
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